sábado, julho 07, 2007

INDECISÕES

Não pode ser! Isto é uma loucura! Não é possível! Amanhã vou por tudo em pratos limpos. Vociferava Luís Miguel andando de um lado para o outro, parecendo um tigre enjaulado. Subitamente para em frente ao espelho do guarda fatos, e, fazendo um ar muito austero e compenetrado diz: - Laura tenho algo de importante a dizer-te. O nosso romance chegou ao fim. Já não te amo. Tu com as tuas maneiras bruscas acabaste com o nosso amor. Ponto final e acabou-se. Luís e Laura conheceram-se três anos antes numa festa de aniversário. Tinha sido amor á primeira vista. Ao fim de dois meses de se conhecerem resolveram partilhar as suas vidas e o seu apartamento. Foram três anos de felicidade, com algumas questiúnculas pelo meio como é natural, entre qualquer casal. Mas agora Luís estava cansado. Via todos os seus amigos com uma vida completamente livre, e, ele sentia-se preso. Acorrentado a Laura que o seguia para todo lado, como é usual entre qualquer casal que se ama. Só que Luís chegara á conclusão de que não amava mais a companheira. Assim resolveu ter uma conversa com ela, e, dizer-lhe duma vez por todas que o seu romance tinha acabado. Faria isso no dia seguinte. Laura era enfermeira, uma moça bonita elegante, de grandes olhos castanhos, com um olhar dulcíssimo. Amava Luís quase com idolatria, e, sentia-se a mulher mais feliz do mundo. Afinal Luís era aquilo a que na gíria se chama um pão. Alto robusto, de rosto oval moreno, onde brilhavam uns olhos pretos que Laura achava serem mais lindos que estrelas. Sentia-se invejada pelas companheiras. Naquele dia, chegou a casa, e para sua surpresa tinha a mesa posta, com duas velas acesas, e uma jarra com um lindo ramo de rosas vermelhas. Ficou surpreendida, pois não esperava aquele acolhimento por parte do seu amado companheiro. Sorridente foi até á cozinha, onde ele se esmerava a fazer o jantar, sorriu-lhe beijou-o e alegremente perguntou: - Então querido o que festejamos hoje? Ao que ele respondeu meio sisudo: - Tenho algo de importante para te comunicar. - Ah sim? Então vou tomar banho num instante enquanto acabas o jantar. Venho cansadíssima, hoje tive um dia para esquecer. Vai saber-me bem ficar em casa a conversar contigo. Alegremente lá foi para o seu banho. Entretanto Luís murmurava entre dentes tudo o que tinha para lhe dizer “ pois minha querida estou farto acabou-se. Vou deixar-te. E cada um vai seguir rumos diferentes, espero que continuemos amigos, afinal já há três anos que vivemos juntos. Nenhum de nós pode encontrar melhor amigo, não concordas? Já tinha posto o jantar na mesa, e o espumante no gelo, quando ela alegre e feliz chega á cozinha. Vinha de roupão, o cabelo ainda molhado preso num rabo de cavalo, o que lhe fazia sobressair a beleza natural do rosto. Destapou a travessa e quase gritou: Lagosta? Deve ser algo de muito importante o que me vais dizer. Deixa-me adivinhar foste finalmente promovido a director? Dizendo isto sentou-se. Luís sentou-se em frente dela, encheu uma taça de espumante e começou: - Laura, a nossa vida vai ter de mudar. Não consigo mais viver contigo…. -Ao ouvir aquilo ela fica de olhos muito abertos, já com algumas lágrimas a quererem saltar. Parou de comer, fitando-o com um ar estarrecido. -Não podemos continuar assim. Não consigo viver contigo nesta situação, temos que mudar de vida…. Nesta altura ela salta da cadeira, corre para ele, abraça-o beija-o e diz-lhe: -Puxa, quase me assustaste. Neste momento o telefone toca, Laura vai atender, era sua amiga Constança, a perguntar se queriam ir ao cinema. Eufórica Laura responde: -Hoje não querida! Aconteceu uma coisa maravilhosa! O Luís pediu-me em casamento agora mesmo. Luís fica atónito ao ouvir aquilo e diz-lhe de longe: -Laura espera estás a fazer…. Pois foi Constança, continua Laura, foi uma surpresa. Ele é um querido. Foi um pedido feito com todo o requinte imagina que até fez lagosta para o jantar. Foi uma surpresa. Está bem querida, então até já. Pousou o telefone, e diz para um Luís completamente aparvalhado: -Querido, a Constança vem aí com mais alguns amigos. Mas Laura ….ia ele tentar explicar, mas, toca o telefone de novo, e Laura atende: -Olá mãe! Boa noite! Está tudo bem sim, tenho uma notícia espantosa para te contar. Claro que é boa, nem podia ser melhor, eu e o Luís vamos casar!! -Que bom minha filha! Eu e o pai vamos já para aí, temos de festejar, e já agora digo á tua irmã, não te preocupes se não tens jantar que chegue nós levamos. -Está bem mãe. Ficamos á espera Olha querido, diz ela radiante, os meus pais e a minha irmã também vem festejar este belo acontecimento connosco. Não é maravilhoso? Vou telefonar aos teus pais, não seria bonito não lhes dizer não achas? Laura parecia um torvelinho. -Mas Laura…qual quê? Laura já estava a falar com sua mãe. Olá D. Joana! Boa noite! Não nada de mal, antes pelo contrário, venham até cá, estamos a festejar. O Luís resolveu propor-me casamento. Sim, sim. Cá os esperamos então. Temos sim, hoje até há lagosta, deu uma gargalhada feliz. Claro que foi, o seu filho é um verdadeiro cavalheiro. Ok então até já. Mais uma vez, Luís tentou chamá-la á razão dizendo: -Laura estás a fazer uma enorme….. Toca a campainha da porta, ele vai abrir e, de supetão sente-se abraçado, beijado, e quase levado no ar por Constança e os amigos. Parabens! Gritavam todos quase em coro. Já não era sem tempo! Luís não sabia já, onde estava coitado, levado por aquele vendaval de gente. Entretanto chegaram os pais de ambos, e foi um esfuziante alarido. O sr. Geraldo pai de Luís abraçou-o dizendo: -Estou muito feliz filho. Já pensava que serias como os rapazes de agora, que fazem casa, constróem família, mas tudo sem ser devidamente formalizado com o casamento. E, não te preocupes, já que decidiste e muito bem, nós pagamos todas as despesas. E entre espumante, lagosta, frango assado, batatas fritas, cerveja, pasteis de bacalhau, a festa continuou animada para os mais jovens; enquanto os pais dos noivos, conversavam sobre os preparativos do casamento. Pobre Luís apanhado naquele furacão, nem sabia já o que dizer. Apenas se deixou levar. Ele há coisas! Ficou logo decidido que o casamento, simples, só com os amigos mais próximos seria dali a um mês, era só o tempo dos preparativos. Aquele mês passou, numa roda viva. Luís mal tinha tempo para pensar. E aqui estava ele, passeando dum lado para o outro, decidido a desmistificar toda aquela trapalhada. Ainda pensou consigo: vão-me matar. Vão chamar-me tudo e mais alguma coisa. Mas casar eu não caso. Isso nem morto. Gastaram dinheiro? Quem lhe encomendou o sermão? E Laura? Que culpa tenho dela ter compreendido mal e não me deixar explicar? Pior para ela. Mas eu não caso. Era o que faltava! Ficara decidido que Laura sairia de casa dos pais, juntamente com estes e Constança, já que esta ia ser sua madrinha, Luís sairia da casa onde viviam, acompanhado dos pais e de Lurdes irmã de Laura, que fizera questão de amadrinhar o cunhado. Tudo pronto, já em cima da hora, e, Luís não havia maneira de sair do quarto. Mais uma vez olhou em redor, dizendo: - Adeus. Vou e não volto mais. Só venho buscar as minhas malas, que felizmente estão feitas. Pensavam que era para sair em lua de mel? Pois enganam-se. Não vai haver lua de mel. Ou por outra vai haver sim, mas só para mim…os outros…quero lá saber dos outros? Alguém me perguntou alguma coisa? Ouviu bater á porta, era a cunhada chamando-o: - Vamos Luís! Aposto que a minha irmã não demora tanto a vestir-se. Até parece que estás com medo. A porta abriu-se, e José namorado de Lurdes diz-lhe a rir, anda lá pá. Estás com medo? Isso é comum a todos os felizes noivos. Por isso é que eu não me caso! E deu uma gargalhada, que deixou Luís ainda mais indisposto. Empurrão daqui, empurrão dali, lá foi até ao carro, dirigindo-se para a igreja. Quase não tinha tempo de chegar ao altar, entra Laura, ele olhou para ela, achou-a deslumbrante no seu vestido verde água, ela não quis ir de branco. O vestido era de corte simples mas muito elegante. Sobre os cabelos trazia, um pequeno chapéu ornamentado com pequenos botões de rosa da cor do vestido, e de onde pendia o véu também do mesmo tom. Estava linda! Ele pensou consigo: Vens muito linda, mas se pensas que assim me apanhas, vais ver a surpresa que irás ter. Ao som da marcha nupcial, e, pelo braço do pai, Laura desliza mais do que anda, a caminho do altar. Ouviu-se o resmalhar dos vestidos das senhoras, a sentarem-se. Laura chega ao altar e a cerimónia começa…. Luís não ouve nada. Está com o pensamento fixo no que se propões fazer, até que surge a pergunta sacramental, Luís Miguel de Sousa, é de sua livre vontade casar com Laura Raquel Rodrigues? Silêncio….. O padre pergunta de novo: -, Luís Miguel de Sousa, é de sua livre vontade casar com Laura Raquel Rodrigues? Como que acordado subitamente de um sonho, Luís vê á sua frente os olhos de Laura, inquietos…numa fracção de segundo ela lembrou-se de toda a cena da noite em que ele supostamente a tinha pedido em casamento; das suas interrupções, a que ela não prestara atenção. Laura tremeu ao ouvir de novo: - Luís Miguel de Sousa, é de sua livre vontade casar com Laura Raquel Rodrigues? Olhou o noivo quase em pânico. Toda a igreja estava em absoluto e pesado silêncio. Subitamente ouve-se a voz de Luís dizer alto e claramente: Sim é! Ouviu-se um enorme e uníssono suspiro de alívio. O sr. Geraldo vermelho, afogueado, limpava com o lenço branco o suor que lhe corria em fio pelo rosto. D. Joana quase teve um fanico. Só D Ifigénia, e o sr. Rodrigues ficaram impávidos e serenos. Afinal, tinham passado por uma situação igualzinha, há quantos anos? Quase quarenta. Quarenta anos de uma enorme e calma felicidade; trocaram um beijo de amoroso carinho, murmurando: -Lembras-te? Parece que afinal todos os jovens têm medo de casar, como nós tivemos Após o lauto copo d’água os noivos sumiram-se em direcção á lua de mel…. E não é que na pressa Luís que tinha arrumado três malas só levou uma? E, foi exactamente a mais pequena. Afinal foi obrigado a voltar para sempre ao apartamento, donde saíra jurando nunca mais voltar…..
Maria Isabel Galveias (Lylybety)

domingo, março 04, 2007

ELA E…….ELES


ANDRÉ André foi o seu primeiro amor. Um amor de menina. Menina de pouco mais de onze anos. Foram criados juntos. Eram um grupo de garotos que juntos corriam pelos campos nos arredores de Lisboa.Ela lembra-se daquele dia em que estavam sentados junto do muro que separava a azinhaga da quinta.Dizia o “Alfinete”:- A Tininha é a minha namorada sabiam?- E a Guida é minha diz o “Malhado” assim chamado porque no seu cabelo louro tinha um madeixa branca, que lhe dava um ar diferente e meio azougado.Perante esta a firmação, o André levanta-se e do alto dos seu doze anos, pergunta muito zangado:- Que é isso? Então tu namoras comigo e agora namoras com ele?Admirada ela pergunta:- Namoro contigo?- Namoras pois. Há três anos- Bem, se namoro contigo não posso namorar com o “Malhado” diz ela na candura dos seu dez anos.Os anos passaram. A vida separou-os, mas no pensamento dela ficou sempre a lembrança daquele seu primeiro amor.Coisas da sua infância, que se desvaneceu no tempo. Passaram-se vinte e cinco anos. Ela estava de novo solteira. Naquela sexta feira, fazia anos. Decidiu oferecer a si mesma, numa romagem de saudade, visitar o seu velho bairro.Quando lá chegou, nada era igual. Só a igreja, um velho largo com o coreto, onde nos santos populares se faziam bailaricos, e, onde ela tanto brincara, e a avenida. Havia ainda a velha taberna, mais nada.Dirigiu-se á taberna, e perguntou pela Tininha da azinhaga. Disseram-lhe que trabalhava numa fábrica de material eléctrico, na zona velha.Dirigiu-se para lá, e, perguntou pela velha amiga ao porteiro. Este prontamente, foi chamá-la.Tininha veio ao portão acompanhada duma colega. Intrigada por não imaginar quem seria a “amiga” que a procurava.Ao ver a sua amiga de infância, as lágrimas vieram-lhe aos olhos, e emocionada diz para a colega:- Olha, esta minha amiga, é a grande paixão de meu irmão André.Guida, ficou perplexa ao ouvir isto, e responde:- Ora, onde isso já vai. Ambos seguimos rumos diferentescasamos, cada um tem a sua vida. Foram coisas da nossa infância.- Coisas de infância não. Eu casei com o “Alfinete”. O André diz muitas vezes, o que os separou foi o mar. E foi também a tua pressa em te casares. Ou já te esqueceste que casaste antes dele? - Ele também parecia que não se importava comigo. Já te esqueceste das gaifonas que ele me fazia com Ausenta?E das vezes que eu passava na tua casa a caminho de casa dos meus tios? Se eu lhe dizia que ia pela rua de baixo, ele ia comigo até á Calçadinha, e seguia pela rua de cima, ou vice versa. Por isso deixei de o levar a sério. Mas também nunca o esqueci.- Se quiseres saber dele, ele trabalha na Centieira. Queres o telefone do trabalho dele? Se lhe telefonares verás. Vai ficar louco de alegria.- Está bem. Eu também vou gostar de falar com ele.As amigas conversaram muito. Afinal havia vinte e cinco anos que não se viam. E tinham tanto para contar uma á outra. Falaram dos amigos de infância dos irmãos de Tininha. O pai desta tinha falecido. A mãe vivia com o Mário seu irmão mais velho. Enfim foi um longo fim de tarde. Depois de jantar com a amiga, Guida voltou para sua casa. Levava o sonho de se encontrar de novo com André. Como iria ser o seu encontro?Mal podia esperar por segunda feira.Depois de um banho relaxante, foi dormir. Mas o sono negava-se a aparecer. Á sua lembrança vinham retalhos de episódios passados com André.A velha oliveira, onde os três amigos tinha colocado três baloiços, para se baloiçarem ao mesmo tempo. Os campos de seara verdejante, onde eles brincavam aos policias e ladrões. As armadilhas que ele armava antes de ir trabalhar, e, que lhes providenciava pássaros, que foram muitas vezes o jantar de sua família. As enormes caminhadas a apanhar caracóis. As vezes que iam apanhar as azeitonas que caiam das oliveiras pela azinhaga, e com as quais a mãe dele fazia azeite para todo ano. Tantas recordações!Lembrou-se daquela noite, em que ele a foi levar a casa e a beijou. Foi o beijo mais estranho que alguma vez sentiu. Era escaldante, no verdadeiro sentido da palavra. Hoje pergunta-se como é possível num garoto de catorze anos haver tanto calor. Aquele beijo escaldante e ao mesmo tempo suave e terno assustou-a, mas, também a marcou para sempre. Ao fim de tantos anos, ainda sentia na sua boca a incandescência daquele beijo apaixonado.Mas, o que tem de ser tem de ser. A vida separou-os, e nunca mais houve entre eles alguma carícia mais ousada.A verdade, é que durante todo o tempo que viveram afastados, nunca a imagem daqueles cabelos loiros, e daqueles olhos muito azuis se afastou da sua memória. Sempre que havia um desaguisado com seu marido, ela pensava: - O André nunca me faria isto. E foi vivendo com a imagem do seu primeiro amor bem escondida no fundo do seu coração. Chegou a tão esperada segunda feira. Há hora do almoço ela telefonou-lhe. Atendeu o segurança, e ela pediu para falar com o sr André Silva, fiel de armazém. Quem devo anunciar pergunta o segurança, divertida ela responde, diga-lhe que é uma velha amiga.Quando ele atendeu o telefone, ela cantarolou: - há muito, muito tempo eras tu uma criança que brincavas ao baloiço e ao pião….Do outro lado, ouviu-se um grito de profundo regozijo: Guidinha!!!! Onde estás minha querida? Há tanto tempo que sonho contigo e sem saber de ti, por favor diz-me onde estás quero ver-te Ela disse-lhe que regressara a Lisboa, trabalhava nos laboratórios Davis, e que também gostaria muito de o ver.Depois de uma longa conversa que parecia que ele não queria terminar nunca, combinaram encontrar-se no trabalho dele por volta das cinco horas, ela saía ás quatro dava tempo mais que suficiente.Sempre escrava do relógio e da pontualidade, á hora marcada ela estava ao portão da fábrica.Ele já tinha dado ordem ao segurança para a mandar subir ao escritório dele logo que ela chegasse, e, assim foi.Ficaram frente a frente, ele completamente extasiado de a ver. Não era por nada, mas Guida estava no apogeu dos seus trinta e poucos anos. Sempre fora uma garota elegante e bonita, mas agora era uma mulher madura, senhora de si e sem que ela própria se apercebesse com um charme, que, fazia voltar a cabeça de qualquer homem que se prezasse de o ser.Enquanto ela a olhava, e quase a comia com os olhos, ela ficou a olhar para aquele pigmeu que teria por aí um metro e meio, continuava com os cabelos loiros, mas tinha os olhos azuis mais deslavados que alguma vez vira. Sorriu e pensou: - e foi por este meia leca, feio e sem graça que eu suspirei mais de vinte anos? Realmente a infância e até a pré adolescência eram muito parvas.Ele olhando-a diz:- a idade não perdoa, mas tu estás muito para alem do que eu imaginava. Eu recordava esta menina, e puxando da carteira mostra uma foto dela, tirada de kodak, em que ela teria uns dez anos, usava trancinhas, e era uma gracinha lá isso era. E continua, hoje estás uma linda mulher madura, com tudo certo no sítio certo. E sem mais aquelas puxou-a para si com força e beijou-a num longo e profundo beijo, que ela nem teve tempo de rejeitar, mas sentiu um certo asco. Num frenesim louco ele abraçava-a e beijava-a desvairado, e só não a possuiu ali mesmo porque o telefone tocou, felizmente, ela estava tão aturdida que nem se debatia nem dizia nada.Ele só murmurava no seu ouvido, quero-te, desejo-te desde a minha infância tens de ser minha.Mas recomposta ela respondeu suavemente: - Calma, o mundo não vai acabar hoje. E, como tinha chegado a hora dele sair, saíram os dois, a custo ele tentava esconder a sua enorme excitação.No dia seguinte ele iria ao médico, na Avª da Liberdade, combinaram almoçar juntos, e assim fizeram. Depois de almoço e como ainda era cedo para a consulta, ele levou-a a um hotel, desejoso de a possuir. Como se fosse a coisa mais natural do mundo, ela foi. Ao principio resistiu, mas ele suplicou-lhe quase a chorar que a deixasse possui-la, ou ainda faria um disparate.Com toda a calma, ela deitou-se, e, pasme-se nem se despiu, apenas levantou a saia. Foi mesmo do género descarrega e deixa-me da mão. Claro que ele ficou um pouco desencantado com a situação, embora ela fosse mestra em fingir. Como já eram horas da consulta, vão os dois até á avenida. Iam lado a lado conversando, sem nada que aparentasse terem estado há pouco tempo na cama os dois, quando de repente ela sente um puxão num braço. Imagine-se, era Linda, a mulher dele, que desconfiou dele sair cedo e não levar o carro, resolveu ir ver se ele tinha ido mesmo ao médico. Guida apanhou um susto, só pensou que fosse algum louco que por ali andasse. Linda tinha conhecido Guida há vinte anos, sempre sentira uns enormes ciúmes porque toda a família de André dizia que devia ter sido Guida a casar com ele, estava completamente desvairada. Com toda a calma, Guida convidou-a a tomar um refresco enquanto André ia á consulta. Acalmou-a, conversou com ela, ficando a saber que ele, na véspera ao chegar a casa tinha dito que queria divorciar-se, porque o amor da vida dele tinha voltado.Guida deu uma boa gargalhada, e tranquilizou Linda, dizendo-lhe: - Lembra-se quando ele veio ferido do ultramar, e ninguem queria que casasse consigo, porque a Linda tinha cortado o cabelo enquanto ele esteve ausente(só de lembrar isso sente vontade de rir, quanta ignorância havia naqueles tempos, até parecia que cortar o cabelo era crime) Fui eu quem o convenceu a casar consigo, porque apesar da familia dele murmurar eu achava que a Linda era uma moça honesta e que o amava. Amava-o mais a ele que ele a si, lembra-se?Por isso, fique tranquila. Eu não lhe vou roubar o seu marido. Alíás nem tenho intenção de voltar a casar. Uma vez chegou. Lavada em lágrimas, Linda desfez-se em desculpas, perante Guida que se sentia culpadissima. Contudo quando André chegou viu-as a conversar afavelmente. Decidiram irem levar Guida a casa dos tios, para que eles vissem que ela estava acompanhada pelo casal. Para Guida, dona e senhora do seu nariz, isso não tinha a menor relevância, mas André, cavalheiro á moda antiga fez questão. Lá foram. A partir daí nunca mais se encontraram. Ele telefonava-lhe para o trabalho, mas ela pedia á colega que dissesse que ela já lá não trabalhava. Um dia, Guida estava sozinha e teve que atender o telefone. Era Tininha, querendo saber dela. Respondeu que já não trabalhava, tinha ido para a Lisnave. Tininha respondeu, se não trabalha aí tem a voz muito igual á dela. Só lhe quero dizer que o meu irmão anda completamente transtornado e queria vê-la. Lamento minha senhora, mas a D. Guida já não trabalha cá.E assim acabou uma história de amor que durou mais de vinte anos para terminar em vinte e quatro horas. Vá lá entender-se os desígnios da vida.Já dizia o professor Agostinho da Silva: - Não faças planos para a vida, pois não sabes os planos que a vida fez para ti.
Arroja, 3 de março de 2007
Maria Isabel Galveias

sexta-feira, fevereiro 09, 2007

AI QUE MAL SE ESCREVE…!

Há já algum tempo que nada escrevo. A minha musa inspiradora deve ter-me deixado, para ir inspirar outro alguém, ou então foi de férias.
Ou será antes preguiça? Não sei muito bem. Mas deve ser preguiça, ando num deixa andar, ou então fica para logo ou para amanhã, e os dias vão passando e eu nada escrevo e nada faço, neste marasmo que é a minha vida.
Ás vezes penso, devo estar doente. Mas por outro lado sinto-me bem. Apenas esta apatia, venho da cama para o PC e vou do PC para a cama, isto a cada meia hora.
Inacreditável, mas dei-me conta de que não tomava banho há mais de uma semana!Só posso estar doente!Mas também, para quê? Eu não saio de casa, não faço nada, não transpiro, não preciso de tomar banho.
Afinal ninguém me visita e não vejo ninguém. Só quando vou á rua, aí sim tenho mesmo de ir pró chuveiro quando chego a casa.
Mas foi exactamente por isso que me apercebi que há mais de uma semana não tomava duche. Se fui á rua há mais de uma semana!
Agora pergunto: - Eu vivo?Acho que apenas vegeto. Enfim cá vou indo neste conformismo estranho.
Ah! Mas quero ilucidar, saí agorinha mesmo do duche heheheheh.Tudo porque vou com a Lurdes ao médico.
Ela foi operada a um joelho e vai tirar os pontos, como não pode conduzir levo-a eu. Mas, saberei ainda conduzir? Há tanto tempo que não o faço, a última vez foi antes do Natal. O pobre do meu carro está para ali paradito, um dia destes não funciona.
Mas o que me fez hoje escrever umas patacudas, foi o facto de ter andado por aqui, pela net, bisbilhotando, de blog em blog, leio uma coisa aqui, outra ali e com pouca vontade, nem sei bem porquê, vou que nem um pardalito, pulando de lado para lado sem muito interesse, no que vejo.
Contudo algo me despertou a atenção, e foi ao fim de algum tempo, ai como eu ando!
Verifiquei que na maioria dos ditos blgs quem escreve fá-lo de uma maneira pouco ortodoxa, ou convencional, assassinando a língua pátria duma maneira assaz indecente.
Isto complica-me com o meu sistema nervoso, e com o meu sentido de tentar bem falar e escrever português.
Será por ser velha?Penso que não! Penso que o idioma de qualquer país, é a sua maior riqueza, por isso não gosto de ver a minha língua materna tão mal escrita.
Que nos telemóveis se abreviem as palavras para que se escreva o máximo de texto, ainda se compreende, mas aqui? Há tanto espaço para quê escrever “k” em vez de quê, e “tb” em vez de também e por aí fora?
Constato que alguns até ostentam um “canudo universitário” assim sendo, admite-se uma escrita destas?
Eu, definitivamente não consigo admitir!
Dirá quem me lê:
- Não admites porque és velha e ranzinza!
Será então por isso?Será que como eu tenho preguiça de fazer alguma coisa, eles têm preguiça de escrever bem?
Será antes com intenção de poupar as letras do teclado, ou os dedos que teclam?
Mas ainda há algo muito pior, é que os jovens escrevem assim nas escolas, e os professores acham bem!Posso ser preguiçosa.
Posso não tomar duche todos os dias.
Posso ficar trancafiada em casa dias e dias a fio.
Posso até ler na transversal qualquer coisa nos blogs ou afins, mas não posso tolerar uma língua portuguesa mal falada e mal escrita.
Chamem-me bota de elástico, velha, ranzinza o que quiserem, mas dá-me um nó no estômago ver tal coisa. Que diriam Camões, Eça ou Aquilino?Pensariam como eu? Aposto que sim.
Arroja, 9 de Fevereiro de 2007
Maria Isabel Galveias

segunda-feira, janeiro 08, 2007

A ALEGRIA DE SER AVÓ

Netos são como heranças: você os ganha sem merecer. Sem ter feito nada para isso, de repente lhe caem do céu. É, como dizem os ingleses, um ato de Deus. Sem se passarem as penas do amor, sem os compromissos do matrimônio, sem as dores da maternidade. E não se trata de um filho apenas suposto, como o filho adotado: o neto é realmente o sangue do seu sangue, filho de filho, mais filho que o filho mesmo... Cinquenta anos, cinquenta e cinco... Você sente, obscuramente, nos seus ossos, que o tempo passou mais depressa do que esperava. Não lhe incomoda envelhecer, é claro. A velhice tem as suas alegrias, as suas compensações — todos dizem isto embora você pessoalmente, ainda não as tenha descoberto — mas acredita. Todavia, também obscuramente, também sentida nos seus ossos, às vezes lhe dá aquela nostalgia da mocidade. Não de amores nem de paixões: a doçura da meia-idade não lhe exige essas efervescências. A saudade é de alguma coisa que você tinha e lhe fugiu sutilmente junto com a mocidade. Bracinhos de criança no seu pescoço. Choro de criança. O tumulto da presença infantil ao seu redor. Meus Deus, para onde foram as suas crianças? Naqueles adultos que hoje são seus filhos, que têm sogro e sogra, cônjuge, emprego, apartamento a prestações, você não encontra de modo nenhum as suas crianças perdidas. São homens e mulheres - não são mais aquelas crianças que você recorda.E então um belo dia, sem que lhe fosse imposta nenhuma das agonias da gestação ou do parto, o doutor lhe põe nos braços um menino. Completamente grátis — aquela criancinha da sua raça, da qual você morria de saudades, símbolo ou penhor da mocidade perdida. Pois aquela criancinha, longe de ser um estranho, é um menino que lhe é "devolvido". E o espantoso é que todos lhe reconhecem o seu direito de o amar com extravagância; ao contrário causaria escândalo e decepção se você não o acolhesse imediatamente com todo aquele amor recalcado que há anos se acumulava, desdenhado, no seu coração. Sim, tenho certeza que a vida nos dá os netos para nos compensar de todas as mutilações trazidas pela velhice. São amores novos, profundos e felizes que vêm ocupar aquele lugar vazio, nostálgico, deixado pelos arroubos juvenis. Aliás, desconfio muito de que os netos são melhores que namorados, pois que as violências da mocidade produzem mais lágrimas do que enlevos. No entanto — no entanto! — nem tudo são flores no caminho da avó. Há, acima de tudo, a rival: a mãe. Não importa que ela seja sua filha. Não deixa por isso de ser mãe do seu neto. Não importa que ela ensine o menino a lhe dar beijos e a lhe chamar de "vovozinha", e lhe conte que de noite, às vezes, ele de repente acorda e pergunta por você. São lisonjas, nada mais. Rigorosamente, nas suas posições respectivas, a mãe e a avó representam, em relação ao neto, papéis muito semelhantes ao da esposa e da amante dos triângulos conjugais. A mãe tem todas as vantagens da domesticidade e da presença constante. Dorme com ele, dá-lhe de comer, dá-lhe banho, veste-o. Embala-o de noite. Contra si tem a fadiga da rotina, a obrigação de educar e o ônus de castigar. Já a avô, não tem direitos legais, mas oferece a sedução do romance e do imprevisto.Mora em outra casa. Traz presentes. Faz coisas não programadas. Leva a passear, "não ralha nunca". Deixa lambuzar de pirulitos. Não tem a menor pretensão pedagógica. É a confidente das horas de ressentimento, o último recurso nos momentos de opressão, a secreta aliada nas crises de rebeldia. Uma noite passada em sua casa é uma deliciosa fuga à rotina, tem todos os encantos de uma aventura. Lá não há linha divisória entre o proibido e o permitido. Dormir sem lavar as mãos, recusar a sopa e comer croquetes, tomar café — café! — mexer no armário da louça, fazer trem com as cadeiras da sala, destruir revistas, derramar a água do gato, acender e apagar a luz elétrica mil vezes se quiser e até fingir que está discando o telefone. Riscar a parece com o lápis dizendo que foi sem querer — e ser acreditado! Fazer má-criação aos gritos e, em vez de apanhar, ir para os braços da avó e de lá escutar os debates sobre os perigos e os erros da educação moderna. Sabe-se que, no reino dos céus, o cristão desfruta os mais requintados prazeres da alma. Porém esses prazeres não estarão muito acima da alegria de sair de mãos dadas com o seu neto, numa manhã de sol. E olhe que aqui embaixo você ainda tem o direito de sentir orgulho, que aos bem-aventurados será defeso. Meu Deus, o olhar das outras avós, com os seus filhotes magricelas ou obesos, a morrerem de inveja do seu maravilhoso neto. E quando você vai embalar o menino e ele, tonto de sono, abre um olho, lhe reconhece, sorri e diz: "Vó!", seu coração estala de felicidade, como pão ao forno. E o misterioso entendimento que há entre avó e neto, na hora em que a mãe o castiga, e ele olha para você, sabendo que, se você não ousa intervir abertamente, pelo menos lhe dá sua incondicional cumplicidade e apoio... Além é claro das compensações.... Até as coisas negativas se viram em alegrias quando se intrometem entre avó e neto: o bibelô de estimação que se quebrou porque o menininho — involuntariamente! — bateu com a bola nele. Está quebrado e remendado, mas enriquecido com preciosas recordações: os cacos na mãozinha, os olhos arregalados, o beiço pronto para o choro; e depois, o sorriso malandro e aliviado porque "ninguém" se zangou, o culpado foi a bola mesma, não foi, Vó? Era um simples boneco que custou caro. Hoje é relíquia: não tem dinheiro que pague.
Ser avó é na verdade uma coisa maravilhosa. Imagine-se ser bisavó, como eu já sou. É a confirmação plena da minha passagem por esta vida.
Lylybety

COISITAS

Hoje foi um dia de saudade. Assisti na TV memória á grande noite do fado. Vi o Fernando Maurício a cantar. Senti uma enorme saudade. Saudade dele, que já partiu há alguns anos, e, saudades de mim, pois já há bastantes anos, que com ele estive no Luso. Nesse tempo, era eu uma jovem de quarenta anos. Pergunto a mim mesma, para onde foi o tempo? É irritante, tenho um espirito muito jovem, acho que terá por aí uns vinte anos, contudo, ao ver-me no espelho, vejo um corpo velho, disforme, em nada correspondente ao espirito, não é para dar raiva? Como o espirito, o corpo não devia envelhecer..... Fiquei também inquieta. É que dou muito valor aos provérbios , raramente me engano, e, pelo que vi, este ano vai ser mais um ano de seca. Porquê? Foi Lua Nova ontem, dia 3, e diz o povo, que, Lua Nova Setembrina, sete meses determina. É verdade! Nunca falha! Os incêndios, voltaram. A falta de água agrava-se. A coisa está a ficar feia. Porque será que a água do mar não apaga os incêndios? Coisas da Natureza.... O que não é da Natureza é o fogo posto, ou será? A natureza humana é tão estranha.... Por uns patacos queima-se um país. Ainda não entendi onde estará o ganho. Enfim, mentalidades, e falta de lei e de ordem, é o que é!. Penso que, se deveria fazer como fizeram os Israelitas, filtrar a água do mar, e, torna-la potável. Mas num país como o meu, só se fosse para arranjar outro ás do futebol no mar, é que se faria alguma coisa..... Olho para a situação deste Portugal, dos pequeninos, e não vejo ninguém capaz de tomar as rédeas deste País. Só existe politiquice, nada de boa política assim não vamos longe não. Estou adoentada. Vou parar por hoje, também, nada disse. E tenho tanto para dizer. Mas hoje não posso, estou muito mal disposta, agoniada, e com vertigens. Será da tela do monitor? Pode ser. Eu não uso óculos, pode ser falta de vista. Mas não há um oftalmologista que acerte com os meus olhos... Já fui a vários, receitam-me óculos que me custam um dinheirão, e na volta não vejo com eles. Vejo melhor sem eles. mas não admira, eu sou mesmo é do contra.... Amanhã haverá mais... Lylybety

sábado, janeiro 06, 2007

SILENCIO, PAZ OU SOLIDÃO?

Chegou do emprego cansada, afinal era o fim de uma semana de trabalho com um horário extenso e cansativo. Pensou para si própria que apesar do cansaço poderia ler todos os mails que não tinha lido, abrir todas as cartas que se foram amontoando ao longo da semana, ver televisão ou simplesmente não fazer nada e ir dormir cedo. Por volta das dez horas da noite, já estava a semicerrar os olhos e pensou que não tardaria muito em ir deitar-se e ler até adormecer. Aquele livro pousado na sua mesa de cabeceira à cerca de dois meses já a incomodava. Até era interessante, caso contrário já o teria posto de parte, simplesmente nos últimos tempos, só conseguia ler duas ou três paginas por noite. No entanto, ao ler um mail que um amigo lhe enviara, reparou num link de um site de musica. Não resistindo ao apelo implícito, foi ao PC , abriu o site indicado e com um sorriso pensou que este seu amigo de longa data sempre tivera bom gosto e a conhecia bem. Deliciada, não sentiu mais o sono e o cansaço e enquanto escutava a música, pegou numa caneta e em várias folhas brancas e começou a escrever. Era noite já alta e ela ouvindo musica de um site da Internet e a escrever os seus pensamentos mais íntimos, foi invadida por uma sensação de conforto e de paz, como há muito não sentia. De tempos a tempos, parava de escrever, fechava os olhos e languidamente deixava que a musica a invadisse, transportando-a para mundos de sonhos e fantasia, de amor e sensualidade. Pensava nele, mas estranhamente não se sentia sozinha ou triste. A solidão por vezes fazia-se sentir, mas ela ao contrário de muita gente, até gostava de alguns momentos em que se sentia afastada de tudo e do silencio que a rodeava. Lembrou-se de uma grande amiga, que se lamentava muitas vezes, por não ter um minuto que fosse, só para estar com ela própria, sozinha e em silêncio total. A noite avançava e ela pensava em todas as pessoas que tinham feito parte da sua vida. Teve saudades dos amigos que não abraçava havia tempo, dos amigos que já tinham partido prematuramente, dos amores que tivera, nas oportunidades não aproveitadas. Sentia que grande parte da sua vida já tinha passado, no entanto isso não a entristeceu, pelo contrário, fez com que ela entendesse, naquela noite de primavera e de repentina insónia, que queria continuar a viver intensamente todos os momentos, como aquele em que sozinha e em silencio apenas lhe chegavam baixinho os sons da musica. Bem haja o seu amigo, por lhe ter lembrado que a música Era uma grande companheira. Tranquilizante e sadia. Quem se sentia só? Ela? Não jamais. Arroja, 20-12-1999 Maria Isabel Galveias -

Á NOITE, DEBAIXO DO VELHO PINHEIRO

No concelho de Sintra, existe lá bem no meio de nenhures, um monte onde fica uma capelinha, dedicada á Senhora da Piedade. É um vulgar monte, para a maioria das pessoas que por lá passam. Nada tem de especial, a não ser a paz que irradia, e a belíssima paisagem que se estende perante os olhos do vulgar visitante. Contudo, para quem tem alma de poeta e sonhador, aquele monte tem algo de fascinação e magia. Só um sonhador, pode ver o maravilhoso pôr de Sol, com cambiantes que vão do violeta, ao vermelho, numa variedade, que inclui todas as cores do Arco Íris. Só uma alma de poeta, para ouvir e entender todos os sons, desde o restolhar da brisa, até ao pipilar dos pássaros. Só um poeta sonhador, para ver as estrelas, cuja luz parece ser mais cintilante. Há até quem diga, que até os extraterrestres, por lá gostam de poisar as suas naves. Será? Quem sou eu, pobre sonhadora, para o desmentir? Uma noite, em que estava em plena contemplação das estrelas, ouvi um ruído fora do usual. Apurei o ouvido e a vista. Que estaria a acontecer? Estava uma noite enluarada, calma, nem a brisa suave se fazia sentir. Só a Lua, cheia, sorridente lá no alto, como que dando as boas vindas, a quem vinha instalar-se na sua linda sala e visitas. Vi então uma velha coruja, que, se instalou no cimo de um ramo do velho pinheiro, que fica perto da clareira. Chegou depois um mocho, que, se instalou ao lado da coruja. Começaram então a conversar. Sim! Não se admirem. Eu ouvia-os conversar, e, entendia tudo o que diziam, talvez porque eu sou daquelas poucas pessoas, que, entendem a magia e o fascínio daquele lugar. Querem que lhes conte o que diziam? Vou contar: Mocho:- Boa noite comadre Coruja, como tem passado? Coruja:- Olá compadre. Eu tenho passado menos mal, com toda a chuva que tem havido, tive até algumas inundações no meu ninho, e o senhor? Mocho:- Sim. Tem chovido bastante, mas é época da chuva não é? Estou muito curioso! Parece que as rolinhas têm algo para contar, e, estou ansioso para ouvir. Coruja:- Sim também sei disso. Foi por essa razão que convoquei todos os animais do monte, para uma assembleia geral. Devem estar a chegar. Novo ruído, este maior que o primeiro. Eram os coelhos, os ratos, as doninhas, os gatos vadios, e, até o Sultão, cão de guarda do casal que fica no monte lá estava. Depois, como se fosse uma lufada de vento, chegaram as aves, pardais, toutinegras, rouxinóis, milhafres garças e também lá estava dona gaivota, em representação da sua aldeia, para tomar nota, do que se iria passar. Por fim, como convidadas de honra, um pouco atrasadas, como é do protocolo, chegaram em voo rasante, duas lindas rolas. Cumprimentaram todos os presentes e instalaram-se no ramo central do velho pinheiro, como figuras principais da assembleia. Boa noite! – disseram, sabemos que estão á espera da nossa história, com interesse e alguma curiosidade. Devemos dizer-lhes, que é uma bonita história, a que hoje lhes trazemos...... AS ROLAS CONTAM A SUA HISTÓRIA ....Esta tarde, quando fomos beber á fonte das Aranhas, estavam duas meninas conversando. Comentavam entre si, um caso que se passou, faz tempo. Conheceram elas, uma jovem, que muitas vezes vinha á fonte, beber água. Naqueles tempos, a fonte jorrava água cristalina, e fresca. A jovem costumava sentar-se no tanque da fonte, e, começava a cantar com voz dolente, o que seriam talvez as suas mágoas. Tinha uma voz maviosa e linda que encantava quem a ouvia. Um dia, a menina, ouviu o trote de um cavalo, e, resolveu esconder-se. Aproximou-se então um jovem cavaleiro, que, também veio beber água, e dar de beber ao seu belo cavalo. Aquele lugar era tão fresco e acolhedor, que o jovem resolveu, sentar-se á sombra, onde acabou por adormecer. Durante o sono, sonhou que havia ali uma bela menina, que cantava uma linda canção de amor, onde falava dum marinheiro, que em tempos partira, e, que nunca mais voltara, deixando a sua amada á espera sem notícias. Lembrou-se então o jovem, de que, ele também fora marinheiro, e que também ele, estava ausente há muitos anos, sem dar notícias a ninguém. Estava precisamente de regresso da sua longa e aventurosa viagem, em terras desconhecidas, das quais voltava, rico e famoso. No seu sonho, o jovem viu a sua velha mãe, triste e chorosa, por não saber se seu filho era ou não vivo, viu também que, seu pai havia já falecido, na ignorância, da sorte que seu filho havia tido, seus irmãos, também haviam emigrado, só estava junto da mãe, a jovem muito bonita que cantava. Embora não soubesse quem seria, o belo cavaleiro, mesmo em sonho ficou apaixonado. E, tão embrenhado estava em seu sonho, que, não deu pela tarde chegar ao fim. Só quando o frio apertou, ele enfim acordou. Contudo, foi á vila comeu, dormiu, e, no dia seguinte voltou á fonte, nem ele mesmo sabia porque lá voltava. Apenas sentia uma enorme vontade de lá voltar. Era ainda manhã. O jovem sentou-se de novo debaixo do velho pinheiro, e ali ficou a ver a paisagem, maravilhosa que todos conhecemos. O seu cavalo afastou-se, deliciando-se com a erva verdinha e fresca dos campos. Já perto do meio dia, veio a jovem de novo á fonte. Ao vê-la o cavaleiro, reconheceu a menina que havia visto em sonho. Não quis deixar passar a oportunidade, de a conhecer, e logo se dirigiu a ela, perguntando? - A menina é de cá, destas paragens? - Como se chama? - O meu nome é Margarida. Sim vivo aqui perto, com uma velha amiga. - Não tem família então? - Não! Só a senhora Berta, que me acolheu, quando eu era pequena. Ela costuma dizer, que de certa forma, eu, vim apaziguar a saudade, dum filho que partiu, e nunca mais voltou nem deu notícias. - A menina sabe o nome desse filho? - Sim. Chamava-se Miguel. Era marinheiro. Se calhar estará no fundo do mar. Tenho muita pena da sra. Berta. Já o marido morreu também com este desgosto.... - A menina tem noivo? - Não senhor. Quem é que quereria casar com alguém como eu? Nem sei quem foram os meus pais.... - E se eu quisesse casar consigo? - Ó meu senhor. Só por brincadeira me diria isso. Alem de que eu também não quero sair de pé da minha velha amiga. Ela não tem mais ninguém. Pobrezinha... e dito isto saiu correndo estrada fora. - O mancebo, chamou o seu cavalo, tomando-o pela arreata, seguiu também pela estrada, que levava ao povoado. - Chegado ali, dirigiu-se a uma velha casa, onde na soleira da porta estava uma idosa senhora, lendo. - O jovem cumprimentou: - Boa noite minha senhora. É por acaso a sra. Berta? - A pobre senhora levantou os olhos e respondeu. Sou sim senhor. E o sr. Quem é? Eu conheço-o? - Ninguém como a senhora, para me conhecer. Eu sou Miguel. O filho que julgava perdido. - A velha senhora, nem queria acreditar nos seus olhos e ouvidos. Comovida abraçou o filho dizendo: - Meu filho querido, porque nunca escreveste? - Minha mãe, na terra por onde andei, não era possível escrever, ou dar notícias. Mas aqui estou. Desta vez para nunca mais partir. Venho muito rico. Vou tirá-la desta pobreza, dar-lhe tudo o que merece, e recompensa-la daquilo que não pude dar-lhe. - Meu filho, sabes, tenho comigo uma donzela, que tem sido a minha alegria, na tua ausência. - Ele fez um ar carrancudo e disse: - E essa donzela, é lhe mais querida do que eu, que sou seu filho? - Não. Mas não a posso abandonar. Foi ela quem me acompanhou sempre. Foi ela quem sustentou esta casa, quando eu deixei de poder trabalhar. Para me levares daqui, terás que a levar também. - Sempre carrancudo ele responde: - Até pode ser. Também preciso de alguém para tomar conta de mim. - Mas meu filho. A Margarida não é uma empregada. É uma filha para mim. - Verdade? Se assim é. Então será mesmo filha. Pois tenciono casar com ela, minha mãe - Mas se tu nem a conheces..!? - Conheço sim. E digo-lhe minha mãe, assim que a vi, disse para comigo: - Esta vai ser a minha esposa e a mãe dos meus filhos... E assim foi. Casaram. E hoje as netinhas desse casal, vêm á fonte beber água, na esperança de que por ali passe algum cavaleiro, que queira com elas casar. O sr. Mocho, diz então: Vai ser difícil. Nos tempos que correm, só se for um motoqueiro.... Mas a D. Coruja, contestou: Cavaleiro, motoqueiro, marinheiro, pouco importa. O importante na vida é o Amor..... tudo o resto virá por acréscimo e a seu tempo.... Bem meus amigos, depois deste belo serão, são horas de cada um regressar ás suas casas. De novo se ouviu o restolhar, lá foi cada um para seu lado. Eu olhei o relógio, e, eram quase 4horas da madrugada... como o tempo tinha passado. A fazer-me companhia, só um rouxinol ficou a cantar, a sua eterna e solitária melancolia..... Digam lá, que este monte não tem magia.... Piedade, 19 de Dezembro de 1999 Maria Isabel Galveias.

UMA NOITE Á CHUVA

Saí de casa. Não conseguia permanecer mais tempo enclausurada dentro do meu quarto, sentada frente ao meu PC, esperando que alguém do outro lado, me dissesse: - Olá! Como vai? Meti-me no meu carro, e parti veloz. Fui como de costume arejar ideias, só, que desta vez, não fui para o meu Monte de Sonho e Magia. Sem bem saber como, dei comigo no alto dum promontório, vendo lá ao fundo o mar, que se agitava irado. Saí do carro. A brisa fria e com cheiro a mar, fustigava-me o rosto, transmitindo-me toda a fúria que transportava consigo. A Natureza estava naquela noite, tão inquieta como eu.. Eram 2h da madrugada, não se via alma viva por aqueles lados.... Apenas se ouvia de vez em quando o grito duma gaivota, que passava em voo rasante.... Eu sentia-me interiormente, destroçada.....Como se o temporal viesse de dentro de mim, as lágrimas corriam-me no rosto, em verdadeiro caudal... Não conseguia controlá-las, e, isso, contribuía para ficar ainda mais enraivecida, contra mim própria. - Porque chorava? Perguntava de mim para mim.... - Acaso sentia saudades? Mas saudades de quê? De quem? Do tempo em que vivia cativa e mal tratada? Das agressões fisicas e psiquicas a que tinha estado sujeita nos últimos anos, e, das quais tivera a coragem de me libertar? Sentia uma enorme raiva.......! Começou a chover.... Entrei para o carro e fiquei a ver a chuva a cair.... O barulho das gotas de água no tejadilho, davam-me Uma enorme sensação de tranquilidade, como se fosse uma melodia de embalar, tocada pelos elementos furiosos da Natureza.... Fiquei a ver a chuva a cair numa cortina de água, que ocultava tudo o que me rodeava.. Estranhamente comecei a distinguir as fitas de água como se estas fossem de cristal, como se a chuva fosse feita de uma cortina de contas brilhantes, com um cambiante de luzes, tão intensa que me feria a vista, obrigando-me a fechar os olhos. Assim fiz. Fui obrigada a fazê-lo. Os raios de luz eram tão fortes que, não me era possível manter os olhos abertos. Senti a porta do carro do abrir. Alguém entrava nele, quem seria? Eu estava completamente paralisada, mas contudo, não tinha medo. Aquela presença a meu lado, era tranquilizante. Senti ainda, uma mão leve que me acariciava o rosto, ao mesmo tempo que, me enxugava as lágrimas que em silêncio me saiam dos olhos cerrados. Uns lábios, quentes e macios, beijaram-me levemente....Aquele beijo suave e aquelas mãos acariciantes, transmitiam uma calma..., uma paz..., tão intensas, tão envolventes...que a própria fúria da Natureza acalmou........ Ouvi uma voz calma, doce e meiga, que murmurava ao meu ouvido: - Calma. Sossega. Já passou. Não chores mais! Porque te sentes tão infeliz? Não há motivo...! Uns braços envolveram-me. Aquela mão suave, puxou-me a cabeça e reclinou-a junto de um peito forte, onde senti bater um coração em ritmo tranquilo - És uma mulher forte, continuou a voz, inteligente. Porque pensas que ninguém gosta de ti? - Porque sinto isso! – murmurei apática - Sentes? Estás sentindo isso neste exacto momento? - S...i...m! N...ã...o! - Sim ou não? – Aí a voz foi um pouco agressiva - N...ã...o! - Assim está bem, já gosto mais, disse suavemente de novo.... - Não me conheces, eu sei. Porém eu amo-te...... - A...m...a...s? murmurei num suspiro - Sim. E muito!!! - Conheço-te? Conheces-me? - Sim!!! - Como? De onde? - Tentei ver, por entre as gotas cristalinas da chuva, o rosto de quem me falava, mas não era possível.. A voz continuou: Conheço-te de todas as noites falar contigo. Sempre á mesma hora, fielmente lá estás..... - Porque não te vejo? Perguntei... - Porque não podes....Só podes sentir-me - E tu podes ver-me, porquê? - Também não posso...Só posso sentir-te também. - Mas... Se não me vês, como podes amar-me? - Amo a tua alma, que tu desnudas completamente, sem disso te aperceberes..... - S...i...m? E como é ela? - Linda! Por isso te amo. Exactamente como tu a mim.... - A...m...o??? - Consegues negá-lo? - Sou assim tão evidente? Se nem o conheço...... - Como não conheces? Todos as noites falas comigo, me dizes tanto de ti, e de tudo o que te cerca, no meio da tua aparente leviandade......! - E que te digo? - Dizes-me nas entrelinhas, o quanto és sensível, amiga do teu amigo, meiga, carinhosa e muito, muito louquinha.....! - Senti mais terno e carinhoso aquele abraço. Mais suave e doce a boca que me beijava com uma ternura, como eu nunca sentira antes.... - Tentei corresponder. Não consegui. Estava completamente paralisada. Só podia falar, e mesmo assim parecia que o nosso diálogo era mais transmissão do pensamento, do que através da fala. - Que me dizia a voz? Cada vez estava mais diluída, Já não entendia mais nada. Longinquamente, falava-me de amor, como se soubesse que amor, era pra mim a prioridade das prioridades. Aquele abraço amigo, começou a desprender-se; aquela voz suave, estava cada vez mais longe, afastando-se lentamente..... Comecei a ouvir uma outra voz mais forte, mais rouca Que cantava: - Aquellos ojos verdes serenos como lagos.... O meu corpo, começou a ficar pesado. A chuva já não batia no tejadilho do carro...Tinha deixado de chover....... Só a luz ainda era intensa, mas consegui abrir os olhos. Vi assombrada, que estava no meu quarto, sentada frente ao meu PC, eram 6h da manhã Afinal que se teria passado? Teria sido um sonho? Abençoado sonho........ 
 24-3-001 -

DIARIO DE UMA MULHER LIVRE

Olá meu querido! Como o prometido é devido, e como eu costumo cumprir as minhas promessas, aqui estou a escrever os acontecimentos do meu dia. Depois que te foste embora, e como sempre, entrei nas catacumbas da incerteza e da dúvida. Sou assim, que posso fazer?! É que tu és para mim uma espécie de manjar dos deuses, mas como eles são maus e desconfiados, depois do doce ,dão-me, sempre algo amargo. Tu por exemplo, és um doce muito amargo. Enfim, eles decidiram assim, ou seria eu quem decidiu? Não sei, e isso é que me incomoda bastante. Seja como for, o certo é, que tenho de aceitar as decisões, sejam elas minhas ou deles ,tenho de viver com elas. Depois da tempestade vem a bonança, não é assim? Assim aconteceu! Dormi profundamente, mas poucas horas. Acordei como de costume às 6h e 30m, meia ensonada, ainda fiquei a preguiçar durante uma hora, depois fui trabalhar. Mas muito chateada, porque tinha comprado uma tarte de frango, E quando fui por ela, para a levar para o meu almoço, já a Mané a tinha comido!!! Assim não vale! Porque eu não mexo em nada dela. Enfim não vale a pena dizer nada. Mas fiquei aborrecida lá isso fiquei. Comecei mal o dia. Tive até, uma certa tendência para o acidente. Primeiro , o carro não queria pegar. Depois tive de dar a volta por cima da relva, porque puseram um camião a impedir-me a passagem. Como a relva estava molhada e a terra fofa, o carro atascou um pouco. Por fim lá consegui sair e chegar á escola já atrasada. Como era de esperar, levei uma rocatela da chefe, mas nada de grave já se vê. Mais tarde, quando ia a entrar no meu “parvalhão”, por artes de magia, a porta salta das dobradiças, isso mesmos literal e exactamente, SIC, elevou-se no ar, e caiu com um estrondo tal, que toda gente que estava na escola, acorreu, a ver o que tinha acontecido. O vidro da dita, ficou reduzido a pedaços, ou antes pedacinhos, o maior dos quais, teria por aí 5cm. Mas não ficou por aqui, o aspirador, quando lhe peguei, partiu-se em dois, já é preciso ter azar!.. Não me terias rogado alguma praga...? Tudo isto aconteceu, entre as 8.30h e as 14h. Hora a que estou a escrever. O resto do dia descrevê-lo hei logo á noite se lá chegar, a bem dizer, não é? Esqueci-me de contar, que como já vem sendo costume, lá vesti o hábito de freira, para ouvir as confissões do Duarte. A penitência que lhe recomendei, foi que jogasse na lotaria ou no totoloto; pois, para a sorte ser completa, só lhe falta um filho preto, de resto tudo lhe acontece. E pensava eu que não tinha sorte...?! Livra!!! Do resto do dia, por estranho que pareça, perdi o rascunho, Mas sei que não foi nada de especial. Até amanhã, meu amor, beijinhos, beijocas, beijufas, Da tua LUISA DAS CATACUMBAS. 6ª feira, 14 de Abril de 2000 Boa noite meu amor...! Hoje foi mais um dia que passou. Um dia igual a todos os dias. Pouco há para contar. São nesta altura 3h. da manhã de Sábado. Achas muito tarde? Pois é muito cedo! Esteve a chover, quase todo o dia. Quando cheguei a casa a Rita veio ter comigo. Conversámos, como é nosso costume. Falámos de ti, e da nossa atribulada relação. Ela acha graça, e pensa que tudo se resolvia entre nós se não houvessem tantos preconceitos, e se tivesse-mos umas mentalidades menos arcaicas. Enfim opiniões dos jovens.. Entretanto, eu fiquei terrivelmente indisposta, não sei se terá sido, por causa de um pastel de nata que comi. Fomos para a minha cama, como é costume, e eu adormeci. Como a Rita ia para o Algarve, com a madrinha, despediu-se e foi-se embora, seriam umas 7h da tarde. As 9.30h. telefona-me a Joana. Disse-me que lhe apetecia sair, porque era 6ªfeira, no Sábado não se trabalhava, enfim deu-me uma boa mão cheia de razões, para irmos sair. Resolvemos ir aos fados. Fui ter com ela. Continuava terrivelmente mal disposta. Ao chegar a casa dela, e depois de beber uma garrafa de água, acabei por vomitar, e lá melhorei um pouco. Fomos para a farra. Passamos um serão agradável, naquele ambiente bom que tu conheces. Acabou ás 2. A Lucinda, esteve connosco, e no final como ela mora no Olival, trouxe-a, lá arranjei mais uma amiga. Cheguei a casa, tomei banho, vim conversar um pouco contigo, através deste meu diário, meio maluco, mas de mim nem outra coisa era de esperar. Dorme bem meu querido. Milhões de beijinhos doces e fofinhos, da tua agoniada LUISA Sábado, 15 de Abril de 2ooo My love, my sweet love, Cá estou eu de novo. Hoje é o 3ª dia do resto das nossas vidas e é Sábado. Ou antes, ontem foi Sábado. E digo ontem porque são 4h. da manhã. Como vês é bem mais tarde do que ontem. Pois é. Deitei-me eram 6h. da manhã. Grande vida! Não é? Não. Não é. Cheguei a casa ás 2.30. Mas estive a falar contigo, por isso me deitei tarde. Que é que essa cabecinha tonta estava a pensar? Acordei com o telefone, [as 10h. era o Ribeiro. Conversei um pouco com ele. Depois foi a Joana, a dizer-me que tinha combinado com o Teixeira, encontrarmo-nos com ele no Feira Nova de Telheiras, a fim de ele nos dar os nossos cheques. Bem, lá fomos. Eu continuava indisposta. Afinal não foi no Feira Nova, mas sim no Continente, a Joana preferiu assim, porque estava lá a colega dos copos, Aqueles que ela nos mostrou, lembras-te? Como eram horas de almoçar, comemos por la. Viemos embora, e eu vim para casa sempre mal disposta, acabei por vomitar outra vez. Deitei-me e dormi um pouco. Melhorei. Eram 9h., lá estava a Joana a telefonar, a convidar-me para sairmos. Sair? Onde? Aos fados claro. Onde haveria de ser? Lá fomos, e lá conquistei mais um amigo e admirador, o Vilaça. Parece boa praça. Mas é um pinga amor... Sei lá os rapapés que me fez. Convidou-nos para irmos ás 6ªs feiras aos fados, ao Leão das Furnas, não sabes onde é? Nem eu.! Parece que é perto do Jardim zoológico, só pode ser, se é leão... Mas ele disse-me que telefonava na 6ª feira e iríamos com ele. Logo se verá. Disse-me ainda, que havia de me ensinar a cantar. Bonito! Agora depois de velha, vou virar Prima Dona. A noite acabou ás 2h.. Vê bem a parva da Joana, queria que eu fosse levar o Vilaça a Sacavem, é maluca! Outra coisa. Achei piada. O Vilaça ofereceu-se para sair connosco, mas foi logo adiantando, que seriam sempre contas á moda do Porto e esta? E bem. Viemos embora, trouxe novamente a Lucinda. E depois do meu banho, vim conversar contigo, para ver se me dá o sono. Mas tu tiras-me o sono não me dás. Mas como tudo o que vem de ti é bom quando não é mau, só para poder escrever para ti, viva a insónia! Por hoje é tudo, um gran............de chicoração desta tua mal disposta e insone LUISA Domingo, 16 de Abril de 2000 Good evening my sweetness, Mis um dia passou. Sem te ver e sem te falar. Hoje para mim, foi dia não. E para a Joana também. Dormi muito pouco e esse pouco foi em sobressalto. Sinto saudades de ti. Sinto também como sempre muitas incertezas. Falta-me ouvir a tua voz a dizer-me que está tudo bem. Estará? Fiz um esforço enorme, para te não telefonar. E por via das dúvidas, tive sempre o télélé, desligado, para evitar tentações. Foi um dia muito aborrecido. A Joana, insistiu para que fosse almoçar com ela, não me apetecia sair de casa, mas lá fui. Ela estava também muito deprimida. Foi ás compras ao Lumiar, lá, encontrou o Agostinho, ele perguntou-lhe se ela queria vir com ele, como ela lhe dissesse que ainda tinha qualquer coisa para comprar, foi-se embora e não esperou por ela. Daí ela ficar muito triste com a frieza dele. Almoçámos, e resolvemos ir ao baile. Só fui para que ela não dissesse, que não a acompanho onde ela gosta de ir, mas fui de muito má vontade. Dançámos um pouco. De repente vejo-a a ir em direcção ao bengaleiro, muito agitada. Fui atrás dela. Estava com um ataque de choro, quis ir para o carro sozinha. Fiz-lhe a vontade. Porém eu também não estava bem. Fui ter com ela, e viemos embora. Propus-lhe um passeio de carro. Apetecia-me conduzir. Já te disse, parece-me, que a condução, para mim é um calmante. Fomos ao Infantado, a uma lanchonete perto das piscinas. É muito agradável. Um dia, talvez, iremos lá os dois. Depois do lanche, fomos dar uma volta saloia. Ás 8h. regressámos a penates. Vim tentar mais uma vez estragar o computador. Depois telefonei á Joana. Não falámos muito, porque estava lá o Agostinho. Aleluia! Aleluia!!! Foi Sol de pouca dura. Ela telefonou-me agora, a dizer que pouco tinham conversado. Não consegui falar com ele. Diz que se sente inferiorizada, e pouco à-vontade. Diz que gostaria de conversar com o Agostinho, como nós conversamos. Mas nós, somos nós, não é my love? Será que voltamos a conversar? Se isso não acontecer, fica pelo menos em mim uma boa recordação. A vida é feita de recordações não é? Estou insegura, em relação a ti. Mas ao mesmo tempo, sinto uma calma, uma tranquilidade, que me deixa assustada. É como se vivesse sem vida. Estranha, esta minha forma de viver...! Agora vou tentar dormir. Amanhã é dia de trabalho. Boa noite amor, um beijo muito grande da tua estranha (bota estranho nela) LUISA 2ª feira 17 de Abril de 2000 Olá meu bem, Sobre o dia de hoje, e porque estou tremendamente nervosa, nada tenho para contar, excepto que fui às Torres de Lisboa, á Unielert, para ir buscar uma credencial, a fim de Ir trabalhar para o Manuel Nunes. Deixei o carro estacionado, e quando cheguei, tinham-lhe dado uma panada, que lhe amolgou a porta de trás, do lado esquerdo toda. Mas enfim. Não há de- ser nada, e se for alguma coisa, que seja uma menina para não ir á tropa, muito embora as meninas agora também irem, porém não é obrigatório, como os rapazes. E mais não digo, pois nada mais tenho para dizer. Agora só falarei perante o meu advogado. Até amanhã, um beijo da desconsolada, LUISA 3ª feira 18 de Abril de 2000 Good evening my love, Que bem que eu escrevo em inglês, não escrevo? Mais um dia passou, sem eu saber de ti. Será que ainda moras no mesmo planeta que eu? Ou já mudaste de sítio? Foi como sempre, um dia igual a todos os dias. Monótono, triste, chuvoso, nem parece Primavera. Estive a fazer promoção da Knorr no Manuel Nunes, em Famões. É uma acção sem brilho. Não há clientes. Ninguém tem dinheiro para compras. Seriam umas 11h. da manhã, quando a Joana, me telefonou. Disse-me que te tinha telefonado, só para ouvir a tua voz. Ela lá sabe. Disse-me que tinhas uma voz triste, e que lhe pareceste adoentado. Depois de sair do meu trabalho, fui á oficina com o carro, para saber quando lá o poderia pôr para arranjar. Só dia 2. Voltei para casa, cansada, e sem vontade de ver ou falar com alguém. Mas não me é possível, sentir um momento de desânimo, porque há sempre alguém que precisa dos meus fracos préstimos, e lá telefona a Joana, dizendo não saber carregar o telemóvel e a pedir a minha ajuda. De má vontade lá fui. Depois ela não quis ir para casa, pois achava que era muito cedo, apetecia-lhe ir petiscar qualquer coisa, lá fomos ao Duarte, comer umas petingas fritas, que por acaso até me souberam muito bem, mas me fizeram muito mal. A Joana insistiu, para que te telefonasse, assim fiz. Porém, se o arrependimento matasse, teria morrido na hora. Mas todo o mal tem um final passa depressa. Também assim aconteceu comigo. Seriam 21h quando o meu telélé tocou. Era o Aníbal, a perguntar se eu já tinha B.I. É que eu fiquei de lhe mandar fotocópia via fax, e ainda não o fiz. Perguntou-me onde estava, porque ele estava em santo António dos Cavaleiros. Disse-lhe. E mais, como ele já me tinha convidado para tomar café umas quantas vezes, desta vez convidei eu. Foi ter connosco. Petiscou. Depois fomos para casa da Joana. É uma pessoa agradável o Aníbal. Conversámos até ás 2 da manhã. Falámos de muitas coisas e de muita gente, incluindo a tua pessoa, como era de prever. Falámos sobretudo de trabalho. Ele tem umas quantas ideias, mas não é idiota, e sem ser ilusionista, também tem umas quantas ilusões. Não. Não me refiro a essas. Refiro-me a ilusões filosóficas e utópicas, de como gostaria de singrar na vida. A Joana, ficou até de lhe arranjar alguns contactos com empresas. Penso que agradaram um ao outro. Depois vim para casa. Sentei-me ao computador, a escrever as memórias do dia. Bem curtas por sinal. E foi assim. Até amanhã meu querido. Um beijo da (tua?) desmemoriada, LUISA 4ª feira dia 19 de Abril de 2000 Olá, quem? Não sei bem Depois de uma manhã, sem graça, e compartilhada com pessoas pouco agradáveis, liguei o telefone, e tinha uma mensagem tua. Milagre! No entanto, não percebi patavina do que dizias. Ouvi, tornei a ouvir, devia estar completamente estúpida, porque continuei sem perceber. Só percebi, que tinhas deixado qualquer coisa para mim com a Manela, qualquer coisa, que eu não iria gostar. Não entendi essa, mas está bem. Mais tarde liguei para ti, para ver se me explicavas, o que querias dizer, mas tu não te mostraste muito interessado. Achei uma certa graça, quando ao atenderes, possivelmente sem te dares conta, disseste, cá está a nossa amiga, pareceu-me ver uma certa ironia na tua voz. Possivelmente estaria enganada. Possivelmente? Perguntaste-me, entre outras coisas, se eu estaria feliz com a minha liberdade, e eu respondi, que a minha liberdade, era condicionada, pela minha consciência. Parece que não percebeste muito bem, o que eu teria querido dizer. Onde andam essas tão famosas antenas? Perdeste faculdades? Tudo me leva a crer que sim. Voltei de novo a ouvir a tua mensagem. Havia nela uma acusação de que eu me auto flagelava, que não entendi muito bem, e como quando eu não sei ou não percebo qualquer coisa, costumo perguntar a quem sabe, voltei a ligar para ti, para que me explicasses o que querias dizer. Porém, quando ias para atender, e possivelmente, possivelmente? Sem te dares conta mais uma vez, disseste: - cá está esta gaja outra vez! Como não quero ser chata, desliguei, bastante chateada, por acaso. Depois de ter falado com a Joana, sobre este assunto, ela falou contigo em resultado dessa conversa, deixei-te uma mensagem em que te peço para, Caso possas e queiras me ligues. Veremos o que farás. É tudo por hoje. Espero que durmas bem. Um beijo da gaja. LUISA 5ª feira 20 de abril de 2000 Olá, continuo sem saber bem o quê. Hoje foi um dia mais ou menos bom. O dia. Porque a noite... Depois de acabar o stok , mandaram-me para casa, pois não se justificava, estar na loja, não havendo mercadoria. Assim, saí e fui á CGD, e depois ao CPP, fazer umas transacções, quando ia a meio caminho, telefonas tu, a dizer-me que ias a Lisboa, e a propores-me um encontro. Claro que como sempre aceitei com satisfação. Fomos a Lisboa, depois disseste-me que tinhas que ir para casa, [porque tinhas deixado arroz-doce ao lume e podia queimar-me], mas entretanto, mais tarde virias á tua lição de [violador] e passarias cá por casa e possivelmente jantarias comigo, porém não tinhas a certeza disso. Ficaste com as certezas todas depois, e decidiste não jantar. Assim foi. E tudo estava bem. Foste embora, dizendo que lá para o S. António, nos voltaríamos a ver, talvez. Concordei. Que mais poderia fazer, contra factos e decisões não há argumentos, não é? Confesso, que não me agrada muito a ideia de não saber muito bem, qual é o meu papel, mas vamos vivendo e vendo, assim, como assim... Saíste, e como eu tinha feito um esforço muito grande para me manter calma e serena, fiquei arrasada. Deitei-me e adormeci. Como sempre, Sol de pouca dura. Não me é permitido dormir. O telefone toca. Ouvi, mas não me apeteceu atender. Era a Joana. Falou com a Manela. Ficou admirada, por eu ás 22h já estar a dormir, porque eu nunca durmo. Pediu até á Manela para ver se eu estaria bem. No entanto a Manela, está-se nas tintas, para que eu me sinta bem ou mal, a bem dizer, como já não precisa de mim... O Júlio, é que não sabendo das intenções dela, não percebendo que ela atendeu o telefone, ao ouvir este tocar, pensou que eu não estaria em casa, mas reparou que eu estava deitada e chamou-me. Aí, não tive outro remédio senão acordar claro. Alguns poucos minutos mais tarde, ligas tu, aflito por causa da tua irresponsabilidade de pai, em relação ao Ricardo. Pobre Ricardo, no meio de desmiolados como vocês, que não sabem ser gente, quanto mais pais...! O resto da história já sabes, não preciso contar mais nada. Só que depois de terem saído, me senti bastante mal. Mas não morri infelizmente, ainda tenho muito que chorar e rir. Boa noite. Luisa 6ª feira 21 de Abril de 2000 Depois de uma noite bastante atribulada, em que não dormi, e me senti bastante mal, em que me lembrei bastante do meu marido, mais velho, e de como ele se sentia antes de falecer, pensei até, que idiotice, se não seria ele a avisar-me do que me poderia acontecer, se eu teimasse em me relacionar contigo. Nunca uma noite foi tão grande. E uma manhã tão comprida. Telefonei á Joana que , nesta altura do campeonato, é a única com quem posso contar por enquanto, já se vê.! Aos trancos e barrancos, lá consegui ir ás compras para o almoço, e lá fui almoçar com ela. Depois dos acontecimentos de ontem, de ti não mereci nem um telefonema a dizer-me como estariam as coisas contigo! Soube que estava tudo bem, porque telefonei ao Ricardo. Pareceu-me calmo e sereno. Pobre Ricardo, já está habituado, coitado. Depois de almoço, senti-me pior do que durante a noite, uma dor forte no peito e nas costas, que me provocava vómitos, e se alongava para o braço, Fez-me pensar, se não iria ter um enfarte, a Joana assustou-se, e teve a infeliz ideia de te dizer, é burra todos os dias, podia ser só aos fins de semana, mas não é aos feriados e tudo. Depois de ir ao Catus, e ter sido medicada, voltei para casa, e graças a Deus, fiquei boa. Decidi então sair com a Joana, e a Regina. De ti nem uma palavra. Muito bem, aplaudo de pé. E este foi mais um dia do resto da minha vida. Espero que durmas bem, e sem cuidados. Só te peço, tem um pouco de respeito carinho e ternura pelo Ricardo, que não pediu para nascer, nem para ser castigado ao Inferno, pois ele não tem culpa se os pais não sabem ou não querem resolver os seus próprios problemas, e não vêm que ele é ainda um menino, que se sente só, e sem saber muito bem ao certo, para onde vai. Por favor cresçam. Já vão sendo horas de deixarem de olhar só para o vosso umbigo! Neste mundo cão, mas que também é de Deus, há mais pessoas, que também têm sentimentos, respeitem-nos. Por hoje é tudo. Estou como deves sentir, indignada. Luisa Sábado, 22 de Abril de 2000 Hoje é Sábado, depois de mais uma noite atribulada, consegui dormir, e durante esse pouco tempo, fui feliz. Também, eu só sou feliz a sonhar. Mas é preciso que esses sonhos me levem para bem longe, até á minha África, e a tudo o que de bom lá deixei, sobretudo a minha juventude. Mas sonhos são sonhos, e a realidade, é bem mais dura e ruim. Acordei ás 11h. De ti, nem sinal. Que é que eu poderia esperar? Nada!!! Telefonei á Joana, é só ela quem me resta a bem dizer. Ás 14.30h. fui arranjar o cabelo. Até a Cristina achou que eu não estava nos meus dias. Ao sair de lá, tive a (grata?) surpresa de te ver. Pouco falámos, tinhas como sempre a roupa no cloreto. Fui até à Joana, sempre a Joana, benza-a Deus! Decidimos, ir á nossa habitual noite de fados. Parece que aquela tonta, resolveu enquanto eu fui á casa de banho, convidar-te a ir também. Apareceste, e foi bom. Sobretudo porque me consegui livrar do melga que é o Vilaça, coitado, lá se foram as suas ilusões!... Foi uma noite morna, sem grandes acontecimentos, o maior dos quais, foi que, não sei porquê, toda a gente desafinou, a cantar, até a Rosinha e o Zé. Ficaste connosco até ás quatro da manhã, ou seriam 5? Eu tive que ficar em casa da Joana, porque burra que sou, esqueci-me das chaves em casa e a Manela só vem 2ª feira á noite, esta burricoide, chegou a lamentar não te ter dado já uma chave da minha casa, assim não teria que ficar na rua. Sou parva, porque dadas as circunstâncias, ficava na rua na mesma, já que, a roupa que tinhas na lixívia, podia estragar-se, e por isso não me virias trazer a chave. Ainda bem que não dei. Não dei nem darei, não mereces nem vale a pena. Porquê? Ainda tens a ousadia de perguntar? E foi assim o Sábado. Curto e sensaborão, veremos como será o domingo. Até lá. Luisa Domingo, 23 de Abril de 2000 Hoje foi Domingo de Páscoa. Fiquei em casa da Joana, como já era do conhecimento geral. Acordámos cedo. Fomos ás compras, ela estava esperançada em que o Agostinho viria almoçar, mas como eu, e tu, calculámos não veio. Homens...! Fomos até ao Infantado tomar café. O Zé Luiz foi connosco. Muito chateadas as duas, porém ela mais do que eu. Eu ainda era suficiente ingénua, para pensar que te lembrarias de mim, antes do dia acabar, parvoíces...! Ainda fomos tentar abri a minha porta, mas não conseguimos. Lembro-me que a Joana, te perguntou, se irias ficar sem dar notícias muito tempo, como tinhas feito, a semana passada, tu garantiste que não. Disseste que telefonarias. Mas o certo é que passou todo o dia, e de ti nem um sinal, o que a ela incomoda mais do que a mim. Á noite depois do jantar, a Joana pediu-me para lhe cantar um fado, cantei mais do que um,. Fomos deitar era quase 1h. da manhã. Ela dormiu logo. Eu como sempre fiquei de plantão a fazer versos á Lua. Ainda te mandei uma mensagem, não sei se a recebeste. Também não estou muito preocupada com isso. Sinto até, que os nós que me atavam a ti, estão muito mais lassos e fáceis de desatar. São nesta altura 5h da manhã de 2ª feira, que será mais um dia que passarei, fora da minha casa. Por hoje é tudo. Espero que passes muito bem. Até amanhã. Luisa 2ª feira 24 de Abril de 2000 e como eu prometi, não sei ainda porquê, nem se valerá a pena, cá estou a contar mais algumas coisas dos meus dias sem sabor, nem cor. Acho que não tenho mais nada a dizer. O meu diário finda aqui, pois aqui findou também toda a nossa atribulada relação amorosa. Luísa, uma mulher livre e feliz

A DAMA DO MONTE

Não estava lá! Ainda não tinha chegado Aquela paisagem agreste e linda, sem ela perdia todo o encanto. Fazia falta, sentada naquela pedra, com o olhar vago, perdido na planície...! Mas quem fazia falta?- perguntarão. Ela! Era ela, quem fazia falta ali no monte, ela que fazia parte daquela linda e agreste paisagem. Era uma senhora de meia idade; ainda se podiam ver nela, vestígios de uma beleza, que, havia já algum tempo tinha perdido o fulgor. Quem visitasse o monte da Piedade, num Sábado aquela hora, decerto a veria, ensimesmada, com o olhar perdido em longínquas paragens. Quem sabe, se recordando momentos felizes da sua juventude?! Ás vezes quando a observava mais atentamente, notava-lhe nos lábios um sorriso enigmático, enquanto lágrimas cristalinas lhe deslizavam pelo rosto, sereno, sem uma contracção ou franzimento. Que recordaria ela? Que acontecimento no seu passado, a faria chorar e sorrir em simultâneo? Outras vezes, com um caderno assente no colo, escrevia...escrevia, quase em frenesim como se quisesse agarrar as lembranças antes que estas desaparecessem. Qualquer que a visse, sentia uma enorme curiosidade... Quem seria? Como se chamava? De onde vinha? Quando acabava de despejar os seus pensamentos para a folhas brancas do seu caderno, a Dama do Monte, levantava-se, olhava em redor com um olhar sonhador, alisava mecanicamente o cabelo e a saia e entrava no seu velho carro arrancando suavemente, como que tendo pena de deixar o monte e a calma que nele reina...! Nós, olhava-mos para ela de longe. Aquela senhora parecia-nos uma miragem inacessível. Pensava-mos todos, que, se nos aproximasse-mos ela se esfumaria no espaço e nunca mais a veríamos ali. Para nós era impensável o Monte da Piedade sem a Dama misteriosa. Se isso acontecesse, toda a magia e encanto daquele lugar desapareceria. Tinha chegado a Primavera. Os dias tornaram-se maiores e mais soalheiros. Nós aguardávamos a chegada da enigmática senhora. Os últimos dias tinham sido de muita chuva, por isso não podemos sair e passear pelo Monte, a nossa esperança era que também a velha senhora não tivesse ido, e que portanto, viesse hoje. Sentados na escadaria da Igreja, esperava-mos que o velho Fiat aparecesse na curva da estrada, mas já a tarde declinava, e do carro nem vestígios...! Olhavamo-nos interrogadoramente, viria? Não nos atrevia-mos a sair dali. E se ela viesse e nós não a víssemos? Tinha-mos decidido que quando ela chegasse nos havíamos de aproximar e tentar falar-lhe. Muito agitada a Sara afirmava: - Eu não lhes dizia? É uma fada! Como adivinhou que queríamos falar-lhe desapareceu...... O André muito senhor dos seus conhecimentos espaciais respondeu: - Que fada que nada! Veio de outro planeta. Eu bem vi quando um ovni aqui desceu e ela saiu! Eu estava sentado na janela do meu quarto. Era uma noite muito escura, só se viam as luzes da nave. Abriu-se uma porta e a Senhora saíu envolta numa cortina de fumo, que eu bem vi!!! O André quase gritava perante o meu olhar de dúvida e o meu sorriso trocista.... - Ninguém pode duvidar do que vejo, ninguém!!! A Sara esticava o pescoço para espreitar a estrada, mas nada, nem carro nem senhora.....nada! Timidamente a Sofia comenta: - Mas que ideia a nossa querermos falar com ela. E tudo só por causa de um cão sem dono.....Agora já não vem mais....! E se....se? - Se o quê Sofia? – pergunta o André de cenho franzido - Se ela...? - ??????? - se ela morreu! Pronto já disse. – A Sofia corou como se tivesse dito um palavrão. - - nem penses uma coisa dessas! – dissemos todos em coro. - Isso não pode ter acontecido.....seria o fim... E tão agitados estávamos, gritando um mais do que o outro, que só parámos quando ouvimos uma vós calma e doce que perguntava: - Seria o fim de quê garotos? Silêncio. Olhamos todos como que enfeitiçados e, lá estava ela a Dama do Monte sorridente, com um pequeno ramo de flores silvestres na mão? Afinal ela falava – pensamos maravilhados. Um pouco a medo, mas mais afoita do que nós, a Sofia aproximou-se e pegou-lhe na mão. Apalpou-lhe a saia branca de seda plissada, parecia não acreditar que fosse verdadeira.... De onde saíra? Nenhum de nós ouvira qualquer barulho, nem carro nem passos, nada... A Sara olhava-nos zombeteira, como que a dizer-nos: É ou não uma fada? Vêm? Eu é que tenho razão! Enquanto o André pensava: - Só um extraterrestre pode aparecer assim sem ninguém dar por isso.... Sendo eu a mais velha do grupo, tomei para mim a responsabilidade de iniciar a conversa com a, para nós, misteriosa senhora. Boa tarde minha senhora, como está hoje? – perguntei com um sorriso que me apanhava a cara toda. - Hoje como sempre, estou bem, muito obrigada. – responde ela suavemente sorrindo. - Desculpe, disse eu, estávamos falando de si. - De mim? Quanta honra! – responde com ar divertido. - E que falavam? Olhámos uns para os outros. E agora? O que devíamos de dizer? Mais uma vez foi a inocente Sofia quem disse: - é que a senhora não estava no sítio do costume, nós não a vimos e receámos que..... Sofia parecia ter-se engasgado. André foi em seu auxílio, pensámos que a senhora tivesse.....morrido diz a Sara, como se atirasse com uma porta. Trás! E porque seria o fim? E o fim de quê alem do meu?- pasmem ela deu uma gargalhada. Sabia rir como nós! Bem comecei a dizer, nós costumamos vê-la quando se senta naquela pedra a olhar lá para baixo sem se mexer, ou quando escreve. Para nós a sra. Tem muito encanto e magia; então decidimos que quando cá voltasse tentaríamos falar-lhe saber quem era, donde vinha, enfim... sabe como é?- ufa! Que discurso! Sentia-me aliviada. Conseguira dizer tudo de um só fôlego.. Muito bem. Diz a Dama; e que querem saber? Estou pronta a responder ao vosso interrogatório. - Verdade?- Perguntámos em coro. - Verdade, verdadinha, verdadeira, responde risonha sentando-se connosco na escadaria. Então posso começar? – pergunto um tanto ou quanto duvidosa. Sim. – responde- podes começar. Então lá vai. Como se chama? De onde é? É uma fada? Uma extraterrestre? Sorrindo ela diz: O que para aí vai! Calma, vamos devagar. Como me chamo? O meu nome é Dulce. Não. Não sou uma fada e também não sou uma extraterrestre. Então?- pergunta a Sara arregalando os seus bonitos olhos azuis. - Porquê tanto interesse na minha pessoa? Senti os olhos de todos fixos em mim, como dizendo:- vamos Marta faz tu as perguntas. Muito educadamente e tímida Sofia diz: - Primeiro deixe que nos apresentemos, eu sou a Sofia, tenho 8 anos e ando no 3º ano, esta é a Sara, tem 10 anos e está no 6º ano, aquela é a Marta, tem 13 anos está no 8º e o André também tem 13 anos e também está no 8º ano. Somos todos amigos. Abençoada Sofia sempre educada e atenciosa, sendo a mais nova era sem dúvida a mais atenta e a mais calma..... e continua: - Sabe sra. D. Dulce, nós costumamos vir para aqui andar de bicicleta aos fins de semana, depois de fazermos os trabalhos de casa. E sempre á mesma hora, vemos a sra. Sentada, imóvel naquela pedra.... A Sara apressadamente diz: - parecia uma estátua, até ao dia em que aquele grande cão amarelo, se aproximou deitou a cabeça no seu colo, e, a senhora lhe fez festas. - O que tem isso de estranho? Inquiriu ela suavemente - Nada - digo eu – fazer festas a um cão, nada tem de estranho. A senhora é que é estranha... - Sou? Nunca tinha dado por isso, diz soltando uma gargalhada. Atónitos nem queríamos acreditar que ela risse exactamente como nós. Olhámos para ela e pareceu-nos de repente que ela se transformara numa jovem da nossa idade rindo e galhofando connosco. Então ela contou que tinha estado em África, que era viúva, que tinha filhos, que tinha netos, que....que....que...uma infinidade de histórias. Ensinou-nos adivinhas: - o que é que é que vai deitado e vem em pé? – É um cântaro! – nenhum de nós sabia o que era um cântaro, nem a candeia que enche a casa até á telha; e, muito menos o que era uma nora com alcatruzes; mas lá que era divertido era. Rindo e brincando, não demos pelo tempo passar. Já eram perto das dez horas da noite quando ela diz:- bem meus queridos, são horas de regressar a penates! E, levantando-se, deu-nos um beijo quente e terno; depois seguiu para o lado de trás da Igreja e desapareceu. Ficámos estáticos, a vê-la desaparecer...... De repente o André diz quase gritando: - Regressar a Penates! É isso! Eu bem tinha razão. - Razão? Porquê? Em quê?- Perguntamos todas á uma. - Nunca ouviram fala em Penates? – são mesmo estúpidas – toda a gente já ouviu falar! Estávamos aturdidas, que raio seria Penates? Doutoralmente o André explicou: - Penates é um planeta satélite da Lua, da Terra e de Marte. - É? Mas nunca nos falaram dele...! só conhecemos nove. E começámos: Mercúrio, Vénus, Terra, Marte....... - Afinal eu tinha razão. Continua o André. A Dama do Monte é uma extraterrestre. Não contestámos. Para quê? Era muito mais bonito ficarmos a pensar que ela era um ser irreal etéreo, do que uma simples mortal de carne e osso como nós. Fomos para casa. Tomei um duche e deitei-me. Adormeci e sonhei que estava em Penates ao lado da linda e misteriosa Dama do Monte...... Penates era um planeta lindo...! Muito verdinho........com muitas flores. E lá, as pessoas não caminhavam no chão, flutuavam como se fossem nuvens no espaço....... Uma coisa assim só mesmo em Penates, diria o André, se podesse ver o meu sonho. Piedade, 13 de Abril de 2001 Maria Isabel Galveias

RECORDAR É VIVER


Hoje fui a uma entrevista a fim de arranjar um emprego, para as minhas horas livres. Foi uma autentica romaria de saudade. A entrevista era nos Olivais. Olivais Sul como agora é designado. No tempo em que lá vivi, era Olivais somente..... Teria que estar ás 13h no n.º 56 da rua Cidade da Beira. Não sabia onde era, no meu tempo por ali só havia quintas, e oliveiras. Fui cedo, para descobrir o local, e, chegar a horas á entrevista, perguntei ao motorista da Carris, onde ficava a dita rua, ele parecia não saber ao certo. Nesta bem fadada terra, se alguém souber alguma coisa vai preso, por certo. Desci do autocarro, na rua de Nampula, passei nas ruas de Quelimane, João Belo, Lourenço Marques, Inhambane.......No espaço de uma hora percorri, Moçambique do Rovuma ao Maputo, até que chaguei á rua Cidade da Beira. Esta rua fica perto do lindo Vale do Silêncio, esse sim, é do meu tempo. Para fazer tempo, pois era ainda muito cedo, entrei num café, e, quando estava tomando a minha bica, entrou um senhor, muito bem disposto e galhofeiro. A empregada começou a brincar com ele, e, ele acabou por dizer que tinha 80 anos. (Não lhe daria mais de 50) Como boa Moçambique, logo entrei na conversa, perguntando se ele era daqueles sítios, ao que ele respondeu: - Sou aqui nascido e criado minha senhora, já lá vão 80 anos.... - Então, deve lembrar-se da Quinta dos Serrões... - Se me lembro! Havia lá uma fábrica de Curtumes, trabalhei lá - Conheceu portanto, o meu avô, ele era o encarregado da fábrica. - Se conheci. Era boa praça esse sr. Paulino, era assim o nome dele não era? - Era sim. Eu fui para essa quinta, quando tinha 18 meses, vivi lá até perto dos 14 anos.... - Ai minha senhora, isso é que eram tempos...! - É verdade! Sabe? Estes Olivais de hoje não me dizem nada, já nem sei onde estou. - Aqui é a quinta do Patacão, lembra-se? - Lembro sim, vim muitas vezes aqui apanhar caracóis, com a Rosita da Alaguesa. - A Rosita? A senhora conheceu a Rosita? - Sim. Fomos criadas juntas. Nunca mais a vi! - Ela mora na Rua Alves Gouveia vejo-a muitas vezes. - Quando estiver com ela, diga-lhe por favor, que encontrou a Belinha dos Serrões, e que ela lhe manda um grande abraço está bem? - Minha senhora, ainda hoje lhe vou dar esse abraço, fique descansada! - O senhor lembra-se, dos bailaricos dos Santos Populares, que havia no Rossio? (Largo da Viscondessa) - Se me lembro... Eram outros tempos. Quantas vezes lá ouvimos os Lírios, no tempo do Jacinto Lopes... - É verdade. Ele cantava tão bem! Havia também os Mensageiros do Ritmo, com o João Loureiro....Era a época do give, das rumbas, o xa-xa-xa, o tango, enfim nesses tempos não eram ainda consideradas danças de salão, dançavam-se em todos os bailaricos... - Minha senhora, nem imagina, quanto me alegro, por poder falar desses tempos, com quem os viveu...Esta mocidade de agora, tem tudo o que nós não tivemos, mas com tanta coisa, que nem sabíamos que existia, nós fomos muito mais felizes. Fala-se da fome que se passava nesse tempo...Eu nunca tive fome! Haviam tantas árvores de fruta, e fruta da boa, sem corantes nem conservantes, como a de agora. Ia-mos á xinxada, e enchia-mos a barriga. Os donos faziam de conta que não nos viam, e no fundo era a maneira da rapaziada se divertir. Não havia droga, nem nada disto que o dito progresso nos trouxe. Eram quase horas da minha entrevista. Com alguma pena, pois havia ainda tanta coisa a recordar ,despedi-me do senhor, dizendo: - Bem tenho de ir. Talvez nos encontremos por aqui mais vezes. - Aí minha senhora. Oxalá assim seja. Hoje foi um dos dias mais felizes que tive. É tão bom recordar o passado! O senhor tinha lágrimas nos olhos, e eu também. Afinal, não sou só eu que tenho saudades, há mais quem tenha. Acrescento, que consegui o tal emprego. Fico duas vezes feliz. Uma porque o consegui, outra porque vou ter oportunidade de voltar a ver aquele senhor, que tanto gosta, como eu, de recordar o nosso lindo bairro dos Olivais, quando ele tinha realmente oliveiras, e, muitas quintas, com alegres camponesas, com quem eu cantava ao desafio. Foi um lindo dia para mim..... Arroja-21-7-2004 Maria Isabel Galveias