segunda-feira, janeiro 08, 2007

A ALEGRIA DE SER AVÓ

Netos são como heranças: você os ganha sem merecer. Sem ter feito nada para isso, de repente lhe caem do céu. É, como dizem os ingleses, um ato de Deus. Sem se passarem as penas do amor, sem os compromissos do matrimônio, sem as dores da maternidade. E não se trata de um filho apenas suposto, como o filho adotado: o neto é realmente o sangue do seu sangue, filho de filho, mais filho que o filho mesmo... Cinquenta anos, cinquenta e cinco... Você sente, obscuramente, nos seus ossos, que o tempo passou mais depressa do que esperava. Não lhe incomoda envelhecer, é claro. A velhice tem as suas alegrias, as suas compensações — todos dizem isto embora você pessoalmente, ainda não as tenha descoberto — mas acredita. Todavia, também obscuramente, também sentida nos seus ossos, às vezes lhe dá aquela nostalgia da mocidade. Não de amores nem de paixões: a doçura da meia-idade não lhe exige essas efervescências. A saudade é de alguma coisa que você tinha e lhe fugiu sutilmente junto com a mocidade. Bracinhos de criança no seu pescoço. Choro de criança. O tumulto da presença infantil ao seu redor. Meus Deus, para onde foram as suas crianças? Naqueles adultos que hoje são seus filhos, que têm sogro e sogra, cônjuge, emprego, apartamento a prestações, você não encontra de modo nenhum as suas crianças perdidas. São homens e mulheres - não são mais aquelas crianças que você recorda.E então um belo dia, sem que lhe fosse imposta nenhuma das agonias da gestação ou do parto, o doutor lhe põe nos braços um menino. Completamente grátis — aquela criancinha da sua raça, da qual você morria de saudades, símbolo ou penhor da mocidade perdida. Pois aquela criancinha, longe de ser um estranho, é um menino que lhe é "devolvido". E o espantoso é que todos lhe reconhecem o seu direito de o amar com extravagância; ao contrário causaria escândalo e decepção se você não o acolhesse imediatamente com todo aquele amor recalcado que há anos se acumulava, desdenhado, no seu coração. Sim, tenho certeza que a vida nos dá os netos para nos compensar de todas as mutilações trazidas pela velhice. São amores novos, profundos e felizes que vêm ocupar aquele lugar vazio, nostálgico, deixado pelos arroubos juvenis. Aliás, desconfio muito de que os netos são melhores que namorados, pois que as violências da mocidade produzem mais lágrimas do que enlevos. No entanto — no entanto! — nem tudo são flores no caminho da avó. Há, acima de tudo, a rival: a mãe. Não importa que ela seja sua filha. Não deixa por isso de ser mãe do seu neto. Não importa que ela ensine o menino a lhe dar beijos e a lhe chamar de "vovozinha", e lhe conte que de noite, às vezes, ele de repente acorda e pergunta por você. São lisonjas, nada mais. Rigorosamente, nas suas posições respectivas, a mãe e a avó representam, em relação ao neto, papéis muito semelhantes ao da esposa e da amante dos triângulos conjugais. A mãe tem todas as vantagens da domesticidade e da presença constante. Dorme com ele, dá-lhe de comer, dá-lhe banho, veste-o. Embala-o de noite. Contra si tem a fadiga da rotina, a obrigação de educar e o ônus de castigar. Já a avô, não tem direitos legais, mas oferece a sedução do romance e do imprevisto.Mora em outra casa. Traz presentes. Faz coisas não programadas. Leva a passear, "não ralha nunca". Deixa lambuzar de pirulitos. Não tem a menor pretensão pedagógica. É a confidente das horas de ressentimento, o último recurso nos momentos de opressão, a secreta aliada nas crises de rebeldia. Uma noite passada em sua casa é uma deliciosa fuga à rotina, tem todos os encantos de uma aventura. Lá não há linha divisória entre o proibido e o permitido. Dormir sem lavar as mãos, recusar a sopa e comer croquetes, tomar café — café! — mexer no armário da louça, fazer trem com as cadeiras da sala, destruir revistas, derramar a água do gato, acender e apagar a luz elétrica mil vezes se quiser e até fingir que está discando o telefone. Riscar a parece com o lápis dizendo que foi sem querer — e ser acreditado! Fazer má-criação aos gritos e, em vez de apanhar, ir para os braços da avó e de lá escutar os debates sobre os perigos e os erros da educação moderna. Sabe-se que, no reino dos céus, o cristão desfruta os mais requintados prazeres da alma. Porém esses prazeres não estarão muito acima da alegria de sair de mãos dadas com o seu neto, numa manhã de sol. E olhe que aqui embaixo você ainda tem o direito de sentir orgulho, que aos bem-aventurados será defeso. Meu Deus, o olhar das outras avós, com os seus filhotes magricelas ou obesos, a morrerem de inveja do seu maravilhoso neto. E quando você vai embalar o menino e ele, tonto de sono, abre um olho, lhe reconhece, sorri e diz: "Vó!", seu coração estala de felicidade, como pão ao forno. E o misterioso entendimento que há entre avó e neto, na hora em que a mãe o castiga, e ele olha para você, sabendo que, se você não ousa intervir abertamente, pelo menos lhe dá sua incondicional cumplicidade e apoio... Além é claro das compensações.... Até as coisas negativas se viram em alegrias quando se intrometem entre avó e neto: o bibelô de estimação que se quebrou porque o menininho — involuntariamente! — bateu com a bola nele. Está quebrado e remendado, mas enriquecido com preciosas recordações: os cacos na mãozinha, os olhos arregalados, o beiço pronto para o choro; e depois, o sorriso malandro e aliviado porque "ninguém" se zangou, o culpado foi a bola mesma, não foi, Vó? Era um simples boneco que custou caro. Hoje é relíquia: não tem dinheiro que pague.
Ser avó é na verdade uma coisa maravilhosa. Imagine-se ser bisavó, como eu já sou. É a confirmação plena da minha passagem por esta vida.
Lylybety

COISITAS

Hoje foi um dia de saudade. Assisti na TV memória á grande noite do fado. Vi o Fernando Maurício a cantar. Senti uma enorme saudade. Saudade dele, que já partiu há alguns anos, e, saudades de mim, pois já há bastantes anos, que com ele estive no Luso. Nesse tempo, era eu uma jovem de quarenta anos. Pergunto a mim mesma, para onde foi o tempo? É irritante, tenho um espirito muito jovem, acho que terá por aí uns vinte anos, contudo, ao ver-me no espelho, vejo um corpo velho, disforme, em nada correspondente ao espirito, não é para dar raiva? Como o espirito, o corpo não devia envelhecer..... Fiquei também inquieta. É que dou muito valor aos provérbios , raramente me engano, e, pelo que vi, este ano vai ser mais um ano de seca. Porquê? Foi Lua Nova ontem, dia 3, e diz o povo, que, Lua Nova Setembrina, sete meses determina. É verdade! Nunca falha! Os incêndios, voltaram. A falta de água agrava-se. A coisa está a ficar feia. Porque será que a água do mar não apaga os incêndios? Coisas da Natureza.... O que não é da Natureza é o fogo posto, ou será? A natureza humana é tão estranha.... Por uns patacos queima-se um país. Ainda não entendi onde estará o ganho. Enfim, mentalidades, e falta de lei e de ordem, é o que é!. Penso que, se deveria fazer como fizeram os Israelitas, filtrar a água do mar, e, torna-la potável. Mas num país como o meu, só se fosse para arranjar outro ás do futebol no mar, é que se faria alguma coisa..... Olho para a situação deste Portugal, dos pequeninos, e não vejo ninguém capaz de tomar as rédeas deste País. Só existe politiquice, nada de boa política assim não vamos longe não. Estou adoentada. Vou parar por hoje, também, nada disse. E tenho tanto para dizer. Mas hoje não posso, estou muito mal disposta, agoniada, e com vertigens. Será da tela do monitor? Pode ser. Eu não uso óculos, pode ser falta de vista. Mas não há um oftalmologista que acerte com os meus olhos... Já fui a vários, receitam-me óculos que me custam um dinheirão, e na volta não vejo com eles. Vejo melhor sem eles. mas não admira, eu sou mesmo é do contra.... Amanhã haverá mais... Lylybety

sábado, janeiro 06, 2007

SILENCIO, PAZ OU SOLIDÃO?

Chegou do emprego cansada, afinal era o fim de uma semana de trabalho com um horário extenso e cansativo. Pensou para si própria que apesar do cansaço poderia ler todos os mails que não tinha lido, abrir todas as cartas que se foram amontoando ao longo da semana, ver televisão ou simplesmente não fazer nada e ir dormir cedo. Por volta das dez horas da noite, já estava a semicerrar os olhos e pensou que não tardaria muito em ir deitar-se e ler até adormecer. Aquele livro pousado na sua mesa de cabeceira à cerca de dois meses já a incomodava. Até era interessante, caso contrário já o teria posto de parte, simplesmente nos últimos tempos, só conseguia ler duas ou três paginas por noite. No entanto, ao ler um mail que um amigo lhe enviara, reparou num link de um site de musica. Não resistindo ao apelo implícito, foi ao PC , abriu o site indicado e com um sorriso pensou que este seu amigo de longa data sempre tivera bom gosto e a conhecia bem. Deliciada, não sentiu mais o sono e o cansaço e enquanto escutava a música, pegou numa caneta e em várias folhas brancas e começou a escrever. Era noite já alta e ela ouvindo musica de um site da Internet e a escrever os seus pensamentos mais íntimos, foi invadida por uma sensação de conforto e de paz, como há muito não sentia. De tempos a tempos, parava de escrever, fechava os olhos e languidamente deixava que a musica a invadisse, transportando-a para mundos de sonhos e fantasia, de amor e sensualidade. Pensava nele, mas estranhamente não se sentia sozinha ou triste. A solidão por vezes fazia-se sentir, mas ela ao contrário de muita gente, até gostava de alguns momentos em que se sentia afastada de tudo e do silencio que a rodeava. Lembrou-se de uma grande amiga, que se lamentava muitas vezes, por não ter um minuto que fosse, só para estar com ela própria, sozinha e em silêncio total. A noite avançava e ela pensava em todas as pessoas que tinham feito parte da sua vida. Teve saudades dos amigos que não abraçava havia tempo, dos amigos que já tinham partido prematuramente, dos amores que tivera, nas oportunidades não aproveitadas. Sentia que grande parte da sua vida já tinha passado, no entanto isso não a entristeceu, pelo contrário, fez com que ela entendesse, naquela noite de primavera e de repentina insónia, que queria continuar a viver intensamente todos os momentos, como aquele em que sozinha e em silencio apenas lhe chegavam baixinho os sons da musica. Bem haja o seu amigo, por lhe ter lembrado que a música Era uma grande companheira. Tranquilizante e sadia. Quem se sentia só? Ela? Não jamais. Arroja, 20-12-1999 Maria Isabel Galveias -

Á NOITE, DEBAIXO DO VELHO PINHEIRO

No concelho de Sintra, existe lá bem no meio de nenhures, um monte onde fica uma capelinha, dedicada á Senhora da Piedade. É um vulgar monte, para a maioria das pessoas que por lá passam. Nada tem de especial, a não ser a paz que irradia, e a belíssima paisagem que se estende perante os olhos do vulgar visitante. Contudo, para quem tem alma de poeta e sonhador, aquele monte tem algo de fascinação e magia. Só um sonhador, pode ver o maravilhoso pôr de Sol, com cambiantes que vão do violeta, ao vermelho, numa variedade, que inclui todas as cores do Arco Íris. Só uma alma de poeta, para ouvir e entender todos os sons, desde o restolhar da brisa, até ao pipilar dos pássaros. Só um poeta sonhador, para ver as estrelas, cuja luz parece ser mais cintilante. Há até quem diga, que até os extraterrestres, por lá gostam de poisar as suas naves. Será? Quem sou eu, pobre sonhadora, para o desmentir? Uma noite, em que estava em plena contemplação das estrelas, ouvi um ruído fora do usual. Apurei o ouvido e a vista. Que estaria a acontecer? Estava uma noite enluarada, calma, nem a brisa suave se fazia sentir. Só a Lua, cheia, sorridente lá no alto, como que dando as boas vindas, a quem vinha instalar-se na sua linda sala e visitas. Vi então uma velha coruja, que, se instalou no cimo de um ramo do velho pinheiro, que fica perto da clareira. Chegou depois um mocho, que, se instalou ao lado da coruja. Começaram então a conversar. Sim! Não se admirem. Eu ouvia-os conversar, e, entendia tudo o que diziam, talvez porque eu sou daquelas poucas pessoas, que, entendem a magia e o fascínio daquele lugar. Querem que lhes conte o que diziam? Vou contar: Mocho:- Boa noite comadre Coruja, como tem passado? Coruja:- Olá compadre. Eu tenho passado menos mal, com toda a chuva que tem havido, tive até algumas inundações no meu ninho, e o senhor? Mocho:- Sim. Tem chovido bastante, mas é época da chuva não é? Estou muito curioso! Parece que as rolinhas têm algo para contar, e, estou ansioso para ouvir. Coruja:- Sim também sei disso. Foi por essa razão que convoquei todos os animais do monte, para uma assembleia geral. Devem estar a chegar. Novo ruído, este maior que o primeiro. Eram os coelhos, os ratos, as doninhas, os gatos vadios, e, até o Sultão, cão de guarda do casal que fica no monte lá estava. Depois, como se fosse uma lufada de vento, chegaram as aves, pardais, toutinegras, rouxinóis, milhafres garças e também lá estava dona gaivota, em representação da sua aldeia, para tomar nota, do que se iria passar. Por fim, como convidadas de honra, um pouco atrasadas, como é do protocolo, chegaram em voo rasante, duas lindas rolas. Cumprimentaram todos os presentes e instalaram-se no ramo central do velho pinheiro, como figuras principais da assembleia. Boa noite! – disseram, sabemos que estão á espera da nossa história, com interesse e alguma curiosidade. Devemos dizer-lhes, que é uma bonita história, a que hoje lhes trazemos...... AS ROLAS CONTAM A SUA HISTÓRIA ....Esta tarde, quando fomos beber á fonte das Aranhas, estavam duas meninas conversando. Comentavam entre si, um caso que se passou, faz tempo. Conheceram elas, uma jovem, que muitas vezes vinha á fonte, beber água. Naqueles tempos, a fonte jorrava água cristalina, e fresca. A jovem costumava sentar-se no tanque da fonte, e, começava a cantar com voz dolente, o que seriam talvez as suas mágoas. Tinha uma voz maviosa e linda que encantava quem a ouvia. Um dia, a menina, ouviu o trote de um cavalo, e, resolveu esconder-se. Aproximou-se então um jovem cavaleiro, que, também veio beber água, e dar de beber ao seu belo cavalo. Aquele lugar era tão fresco e acolhedor, que o jovem resolveu, sentar-se á sombra, onde acabou por adormecer. Durante o sono, sonhou que havia ali uma bela menina, que cantava uma linda canção de amor, onde falava dum marinheiro, que em tempos partira, e, que nunca mais voltara, deixando a sua amada á espera sem notícias. Lembrou-se então o jovem, de que, ele também fora marinheiro, e que também ele, estava ausente há muitos anos, sem dar notícias a ninguém. Estava precisamente de regresso da sua longa e aventurosa viagem, em terras desconhecidas, das quais voltava, rico e famoso. No seu sonho, o jovem viu a sua velha mãe, triste e chorosa, por não saber se seu filho era ou não vivo, viu também que, seu pai havia já falecido, na ignorância, da sorte que seu filho havia tido, seus irmãos, também haviam emigrado, só estava junto da mãe, a jovem muito bonita que cantava. Embora não soubesse quem seria, o belo cavaleiro, mesmo em sonho ficou apaixonado. E, tão embrenhado estava em seu sonho, que, não deu pela tarde chegar ao fim. Só quando o frio apertou, ele enfim acordou. Contudo, foi á vila comeu, dormiu, e, no dia seguinte voltou á fonte, nem ele mesmo sabia porque lá voltava. Apenas sentia uma enorme vontade de lá voltar. Era ainda manhã. O jovem sentou-se de novo debaixo do velho pinheiro, e ali ficou a ver a paisagem, maravilhosa que todos conhecemos. O seu cavalo afastou-se, deliciando-se com a erva verdinha e fresca dos campos. Já perto do meio dia, veio a jovem de novo á fonte. Ao vê-la o cavaleiro, reconheceu a menina que havia visto em sonho. Não quis deixar passar a oportunidade, de a conhecer, e logo se dirigiu a ela, perguntando? - A menina é de cá, destas paragens? - Como se chama? - O meu nome é Margarida. Sim vivo aqui perto, com uma velha amiga. - Não tem família então? - Não! Só a senhora Berta, que me acolheu, quando eu era pequena. Ela costuma dizer, que de certa forma, eu, vim apaziguar a saudade, dum filho que partiu, e nunca mais voltou nem deu notícias. - A menina sabe o nome desse filho? - Sim. Chamava-se Miguel. Era marinheiro. Se calhar estará no fundo do mar. Tenho muita pena da sra. Berta. Já o marido morreu também com este desgosto.... - A menina tem noivo? - Não senhor. Quem é que quereria casar com alguém como eu? Nem sei quem foram os meus pais.... - E se eu quisesse casar consigo? - Ó meu senhor. Só por brincadeira me diria isso. Alem de que eu também não quero sair de pé da minha velha amiga. Ela não tem mais ninguém. Pobrezinha... e dito isto saiu correndo estrada fora. - O mancebo, chamou o seu cavalo, tomando-o pela arreata, seguiu também pela estrada, que levava ao povoado. - Chegado ali, dirigiu-se a uma velha casa, onde na soleira da porta estava uma idosa senhora, lendo. - O jovem cumprimentou: - Boa noite minha senhora. É por acaso a sra. Berta? - A pobre senhora levantou os olhos e respondeu. Sou sim senhor. E o sr. Quem é? Eu conheço-o? - Ninguém como a senhora, para me conhecer. Eu sou Miguel. O filho que julgava perdido. - A velha senhora, nem queria acreditar nos seus olhos e ouvidos. Comovida abraçou o filho dizendo: - Meu filho querido, porque nunca escreveste? - Minha mãe, na terra por onde andei, não era possível escrever, ou dar notícias. Mas aqui estou. Desta vez para nunca mais partir. Venho muito rico. Vou tirá-la desta pobreza, dar-lhe tudo o que merece, e recompensa-la daquilo que não pude dar-lhe. - Meu filho, sabes, tenho comigo uma donzela, que tem sido a minha alegria, na tua ausência. - Ele fez um ar carrancudo e disse: - E essa donzela, é lhe mais querida do que eu, que sou seu filho? - Não. Mas não a posso abandonar. Foi ela quem me acompanhou sempre. Foi ela quem sustentou esta casa, quando eu deixei de poder trabalhar. Para me levares daqui, terás que a levar também. - Sempre carrancudo ele responde: - Até pode ser. Também preciso de alguém para tomar conta de mim. - Mas meu filho. A Margarida não é uma empregada. É uma filha para mim. - Verdade? Se assim é. Então será mesmo filha. Pois tenciono casar com ela, minha mãe - Mas se tu nem a conheces..!? - Conheço sim. E digo-lhe minha mãe, assim que a vi, disse para comigo: - Esta vai ser a minha esposa e a mãe dos meus filhos... E assim foi. Casaram. E hoje as netinhas desse casal, vêm á fonte beber água, na esperança de que por ali passe algum cavaleiro, que queira com elas casar. O sr. Mocho, diz então: Vai ser difícil. Nos tempos que correm, só se for um motoqueiro.... Mas a D. Coruja, contestou: Cavaleiro, motoqueiro, marinheiro, pouco importa. O importante na vida é o Amor..... tudo o resto virá por acréscimo e a seu tempo.... Bem meus amigos, depois deste belo serão, são horas de cada um regressar ás suas casas. De novo se ouviu o restolhar, lá foi cada um para seu lado. Eu olhei o relógio, e, eram quase 4horas da madrugada... como o tempo tinha passado. A fazer-me companhia, só um rouxinol ficou a cantar, a sua eterna e solitária melancolia..... Digam lá, que este monte não tem magia.... Piedade, 19 de Dezembro de 1999 Maria Isabel Galveias.

UMA NOITE Á CHUVA

Saí de casa. Não conseguia permanecer mais tempo enclausurada dentro do meu quarto, sentada frente ao meu PC, esperando que alguém do outro lado, me dissesse: - Olá! Como vai? Meti-me no meu carro, e parti veloz. Fui como de costume arejar ideias, só, que desta vez, não fui para o meu Monte de Sonho e Magia. Sem bem saber como, dei comigo no alto dum promontório, vendo lá ao fundo o mar, que se agitava irado. Saí do carro. A brisa fria e com cheiro a mar, fustigava-me o rosto, transmitindo-me toda a fúria que transportava consigo. A Natureza estava naquela noite, tão inquieta como eu.. Eram 2h da madrugada, não se via alma viva por aqueles lados.... Apenas se ouvia de vez em quando o grito duma gaivota, que passava em voo rasante.... Eu sentia-me interiormente, destroçada.....Como se o temporal viesse de dentro de mim, as lágrimas corriam-me no rosto, em verdadeiro caudal... Não conseguia controlá-las, e, isso, contribuía para ficar ainda mais enraivecida, contra mim própria. - Porque chorava? Perguntava de mim para mim.... - Acaso sentia saudades? Mas saudades de quê? De quem? Do tempo em que vivia cativa e mal tratada? Das agressões fisicas e psiquicas a que tinha estado sujeita nos últimos anos, e, das quais tivera a coragem de me libertar? Sentia uma enorme raiva.......! Começou a chover.... Entrei para o carro e fiquei a ver a chuva a cair.... O barulho das gotas de água no tejadilho, davam-me Uma enorme sensação de tranquilidade, como se fosse uma melodia de embalar, tocada pelos elementos furiosos da Natureza.... Fiquei a ver a chuva a cair numa cortina de água, que ocultava tudo o que me rodeava.. Estranhamente comecei a distinguir as fitas de água como se estas fossem de cristal, como se a chuva fosse feita de uma cortina de contas brilhantes, com um cambiante de luzes, tão intensa que me feria a vista, obrigando-me a fechar os olhos. Assim fiz. Fui obrigada a fazê-lo. Os raios de luz eram tão fortes que, não me era possível manter os olhos abertos. Senti a porta do carro do abrir. Alguém entrava nele, quem seria? Eu estava completamente paralisada, mas contudo, não tinha medo. Aquela presença a meu lado, era tranquilizante. Senti ainda, uma mão leve que me acariciava o rosto, ao mesmo tempo que, me enxugava as lágrimas que em silêncio me saiam dos olhos cerrados. Uns lábios, quentes e macios, beijaram-me levemente....Aquele beijo suave e aquelas mãos acariciantes, transmitiam uma calma..., uma paz..., tão intensas, tão envolventes...que a própria fúria da Natureza acalmou........ Ouvi uma voz calma, doce e meiga, que murmurava ao meu ouvido: - Calma. Sossega. Já passou. Não chores mais! Porque te sentes tão infeliz? Não há motivo...! Uns braços envolveram-me. Aquela mão suave, puxou-me a cabeça e reclinou-a junto de um peito forte, onde senti bater um coração em ritmo tranquilo - És uma mulher forte, continuou a voz, inteligente. Porque pensas que ninguém gosta de ti? - Porque sinto isso! – murmurei apática - Sentes? Estás sentindo isso neste exacto momento? - S...i...m! N...ã...o! - Sim ou não? – Aí a voz foi um pouco agressiva - N...ã...o! - Assim está bem, já gosto mais, disse suavemente de novo.... - Não me conheces, eu sei. Porém eu amo-te...... - A...m...a...s? murmurei num suspiro - Sim. E muito!!! - Conheço-te? Conheces-me? - Sim!!! - Como? De onde? - Tentei ver, por entre as gotas cristalinas da chuva, o rosto de quem me falava, mas não era possível.. A voz continuou: Conheço-te de todas as noites falar contigo. Sempre á mesma hora, fielmente lá estás..... - Porque não te vejo? Perguntei... - Porque não podes....Só podes sentir-me - E tu podes ver-me, porquê? - Também não posso...Só posso sentir-te também. - Mas... Se não me vês, como podes amar-me? - Amo a tua alma, que tu desnudas completamente, sem disso te aperceberes..... - S...i...m? E como é ela? - Linda! Por isso te amo. Exactamente como tu a mim.... - A...m...o??? - Consegues negá-lo? - Sou assim tão evidente? Se nem o conheço...... - Como não conheces? Todos as noites falas comigo, me dizes tanto de ti, e de tudo o que te cerca, no meio da tua aparente leviandade......! - E que te digo? - Dizes-me nas entrelinhas, o quanto és sensível, amiga do teu amigo, meiga, carinhosa e muito, muito louquinha.....! - Senti mais terno e carinhoso aquele abraço. Mais suave e doce a boca que me beijava com uma ternura, como eu nunca sentira antes.... - Tentei corresponder. Não consegui. Estava completamente paralisada. Só podia falar, e mesmo assim parecia que o nosso diálogo era mais transmissão do pensamento, do que através da fala. - Que me dizia a voz? Cada vez estava mais diluída, Já não entendia mais nada. Longinquamente, falava-me de amor, como se soubesse que amor, era pra mim a prioridade das prioridades. Aquele abraço amigo, começou a desprender-se; aquela voz suave, estava cada vez mais longe, afastando-se lentamente..... Comecei a ouvir uma outra voz mais forte, mais rouca Que cantava: - Aquellos ojos verdes serenos como lagos.... O meu corpo, começou a ficar pesado. A chuva já não batia no tejadilho do carro...Tinha deixado de chover....... Só a luz ainda era intensa, mas consegui abrir os olhos. Vi assombrada, que estava no meu quarto, sentada frente ao meu PC, eram 6h da manhã Afinal que se teria passado? Teria sido um sonho? Abençoado sonho........ 
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DIARIO DE UMA MULHER LIVRE

Olá meu querido! Como o prometido é devido, e como eu costumo cumprir as minhas promessas, aqui estou a escrever os acontecimentos do meu dia. Depois que te foste embora, e como sempre, entrei nas catacumbas da incerteza e da dúvida. Sou assim, que posso fazer?! É que tu és para mim uma espécie de manjar dos deuses, mas como eles são maus e desconfiados, depois do doce ,dão-me, sempre algo amargo. Tu por exemplo, és um doce muito amargo. Enfim, eles decidiram assim, ou seria eu quem decidiu? Não sei, e isso é que me incomoda bastante. Seja como for, o certo é, que tenho de aceitar as decisões, sejam elas minhas ou deles ,tenho de viver com elas. Depois da tempestade vem a bonança, não é assim? Assim aconteceu! Dormi profundamente, mas poucas horas. Acordei como de costume às 6h e 30m, meia ensonada, ainda fiquei a preguiçar durante uma hora, depois fui trabalhar. Mas muito chateada, porque tinha comprado uma tarte de frango, E quando fui por ela, para a levar para o meu almoço, já a Mané a tinha comido!!! Assim não vale! Porque eu não mexo em nada dela. Enfim não vale a pena dizer nada. Mas fiquei aborrecida lá isso fiquei. Comecei mal o dia. Tive até, uma certa tendência para o acidente. Primeiro , o carro não queria pegar. Depois tive de dar a volta por cima da relva, porque puseram um camião a impedir-me a passagem. Como a relva estava molhada e a terra fofa, o carro atascou um pouco. Por fim lá consegui sair e chegar á escola já atrasada. Como era de esperar, levei uma rocatela da chefe, mas nada de grave já se vê. Mais tarde, quando ia a entrar no meu “parvalhão”, por artes de magia, a porta salta das dobradiças, isso mesmos literal e exactamente, SIC, elevou-se no ar, e caiu com um estrondo tal, que toda gente que estava na escola, acorreu, a ver o que tinha acontecido. O vidro da dita, ficou reduzido a pedaços, ou antes pedacinhos, o maior dos quais, teria por aí 5cm. Mas não ficou por aqui, o aspirador, quando lhe peguei, partiu-se em dois, já é preciso ter azar!.. Não me terias rogado alguma praga...? Tudo isto aconteceu, entre as 8.30h e as 14h. Hora a que estou a escrever. O resto do dia descrevê-lo hei logo á noite se lá chegar, a bem dizer, não é? Esqueci-me de contar, que como já vem sendo costume, lá vesti o hábito de freira, para ouvir as confissões do Duarte. A penitência que lhe recomendei, foi que jogasse na lotaria ou no totoloto; pois, para a sorte ser completa, só lhe falta um filho preto, de resto tudo lhe acontece. E pensava eu que não tinha sorte...?! Livra!!! Do resto do dia, por estranho que pareça, perdi o rascunho, Mas sei que não foi nada de especial. Até amanhã, meu amor, beijinhos, beijocas, beijufas, Da tua LUISA DAS CATACUMBAS. 6ª feira, 14 de Abril de 2000 Boa noite meu amor...! Hoje foi mais um dia que passou. Um dia igual a todos os dias. Pouco há para contar. São nesta altura 3h. da manhã de Sábado. Achas muito tarde? Pois é muito cedo! Esteve a chover, quase todo o dia. Quando cheguei a casa a Rita veio ter comigo. Conversámos, como é nosso costume. Falámos de ti, e da nossa atribulada relação. Ela acha graça, e pensa que tudo se resolvia entre nós se não houvessem tantos preconceitos, e se tivesse-mos umas mentalidades menos arcaicas. Enfim opiniões dos jovens.. Entretanto, eu fiquei terrivelmente indisposta, não sei se terá sido, por causa de um pastel de nata que comi. Fomos para a minha cama, como é costume, e eu adormeci. Como a Rita ia para o Algarve, com a madrinha, despediu-se e foi-se embora, seriam umas 7h da tarde. As 9.30h. telefona-me a Joana. Disse-me que lhe apetecia sair, porque era 6ªfeira, no Sábado não se trabalhava, enfim deu-me uma boa mão cheia de razões, para irmos sair. Resolvemos ir aos fados. Fui ter com ela. Continuava terrivelmente mal disposta. Ao chegar a casa dela, e depois de beber uma garrafa de água, acabei por vomitar, e lá melhorei um pouco. Fomos para a farra. Passamos um serão agradável, naquele ambiente bom que tu conheces. Acabou ás 2. A Lucinda, esteve connosco, e no final como ela mora no Olival, trouxe-a, lá arranjei mais uma amiga. Cheguei a casa, tomei banho, vim conversar um pouco contigo, através deste meu diário, meio maluco, mas de mim nem outra coisa era de esperar. Dorme bem meu querido. Milhões de beijinhos doces e fofinhos, da tua agoniada LUISA Sábado, 15 de Abril de 2ooo My love, my sweet love, Cá estou eu de novo. Hoje é o 3ª dia do resto das nossas vidas e é Sábado. Ou antes, ontem foi Sábado. E digo ontem porque são 4h. da manhã. Como vês é bem mais tarde do que ontem. Pois é. Deitei-me eram 6h. da manhã. Grande vida! Não é? Não. Não é. Cheguei a casa ás 2.30. Mas estive a falar contigo, por isso me deitei tarde. Que é que essa cabecinha tonta estava a pensar? Acordei com o telefone, [as 10h. era o Ribeiro. Conversei um pouco com ele. Depois foi a Joana, a dizer-me que tinha combinado com o Teixeira, encontrarmo-nos com ele no Feira Nova de Telheiras, a fim de ele nos dar os nossos cheques. Bem, lá fomos. Eu continuava indisposta. Afinal não foi no Feira Nova, mas sim no Continente, a Joana preferiu assim, porque estava lá a colega dos copos, Aqueles que ela nos mostrou, lembras-te? Como eram horas de almoçar, comemos por la. Viemos embora, e eu vim para casa sempre mal disposta, acabei por vomitar outra vez. Deitei-me e dormi um pouco. Melhorei. Eram 9h., lá estava a Joana a telefonar, a convidar-me para sairmos. Sair? Onde? Aos fados claro. Onde haveria de ser? Lá fomos, e lá conquistei mais um amigo e admirador, o Vilaça. Parece boa praça. Mas é um pinga amor... Sei lá os rapapés que me fez. Convidou-nos para irmos ás 6ªs feiras aos fados, ao Leão das Furnas, não sabes onde é? Nem eu.! Parece que é perto do Jardim zoológico, só pode ser, se é leão... Mas ele disse-me que telefonava na 6ª feira e iríamos com ele. Logo se verá. Disse-me ainda, que havia de me ensinar a cantar. Bonito! Agora depois de velha, vou virar Prima Dona. A noite acabou ás 2h.. Vê bem a parva da Joana, queria que eu fosse levar o Vilaça a Sacavem, é maluca! Outra coisa. Achei piada. O Vilaça ofereceu-se para sair connosco, mas foi logo adiantando, que seriam sempre contas á moda do Porto e esta? E bem. Viemos embora, trouxe novamente a Lucinda. E depois do meu banho, vim conversar contigo, para ver se me dá o sono. Mas tu tiras-me o sono não me dás. Mas como tudo o que vem de ti é bom quando não é mau, só para poder escrever para ti, viva a insónia! Por hoje é tudo, um gran............de chicoração desta tua mal disposta e insone LUISA Domingo, 16 de Abril de 2000 Good evening my sweetness, Mis um dia passou. Sem te ver e sem te falar. Hoje para mim, foi dia não. E para a Joana também. Dormi muito pouco e esse pouco foi em sobressalto. Sinto saudades de ti. Sinto também como sempre muitas incertezas. Falta-me ouvir a tua voz a dizer-me que está tudo bem. Estará? Fiz um esforço enorme, para te não telefonar. E por via das dúvidas, tive sempre o télélé, desligado, para evitar tentações. Foi um dia muito aborrecido. A Joana, insistiu para que fosse almoçar com ela, não me apetecia sair de casa, mas lá fui. Ela estava também muito deprimida. Foi ás compras ao Lumiar, lá, encontrou o Agostinho, ele perguntou-lhe se ela queria vir com ele, como ela lhe dissesse que ainda tinha qualquer coisa para comprar, foi-se embora e não esperou por ela. Daí ela ficar muito triste com a frieza dele. Almoçámos, e resolvemos ir ao baile. Só fui para que ela não dissesse, que não a acompanho onde ela gosta de ir, mas fui de muito má vontade. Dançámos um pouco. De repente vejo-a a ir em direcção ao bengaleiro, muito agitada. Fui atrás dela. Estava com um ataque de choro, quis ir para o carro sozinha. Fiz-lhe a vontade. Porém eu também não estava bem. Fui ter com ela, e viemos embora. Propus-lhe um passeio de carro. Apetecia-me conduzir. Já te disse, parece-me, que a condução, para mim é um calmante. Fomos ao Infantado, a uma lanchonete perto das piscinas. É muito agradável. Um dia, talvez, iremos lá os dois. Depois do lanche, fomos dar uma volta saloia. Ás 8h. regressámos a penates. Vim tentar mais uma vez estragar o computador. Depois telefonei á Joana. Não falámos muito, porque estava lá o Agostinho. Aleluia! Aleluia!!! Foi Sol de pouca dura. Ela telefonou-me agora, a dizer que pouco tinham conversado. Não consegui falar com ele. Diz que se sente inferiorizada, e pouco à-vontade. Diz que gostaria de conversar com o Agostinho, como nós conversamos. Mas nós, somos nós, não é my love? Será que voltamos a conversar? Se isso não acontecer, fica pelo menos em mim uma boa recordação. A vida é feita de recordações não é? Estou insegura, em relação a ti. Mas ao mesmo tempo, sinto uma calma, uma tranquilidade, que me deixa assustada. É como se vivesse sem vida. Estranha, esta minha forma de viver...! Agora vou tentar dormir. Amanhã é dia de trabalho. Boa noite amor, um beijo muito grande da tua estranha (bota estranho nela) LUISA 2ª feira 17 de Abril de 2000 Olá meu bem, Sobre o dia de hoje, e porque estou tremendamente nervosa, nada tenho para contar, excepto que fui às Torres de Lisboa, á Unielert, para ir buscar uma credencial, a fim de Ir trabalhar para o Manuel Nunes. Deixei o carro estacionado, e quando cheguei, tinham-lhe dado uma panada, que lhe amolgou a porta de trás, do lado esquerdo toda. Mas enfim. Não há de- ser nada, e se for alguma coisa, que seja uma menina para não ir á tropa, muito embora as meninas agora também irem, porém não é obrigatório, como os rapazes. E mais não digo, pois nada mais tenho para dizer. Agora só falarei perante o meu advogado. Até amanhã, um beijo da desconsolada, LUISA 3ª feira 18 de Abril de 2000 Good evening my love, Que bem que eu escrevo em inglês, não escrevo? Mais um dia passou, sem eu saber de ti. Será que ainda moras no mesmo planeta que eu? Ou já mudaste de sítio? Foi como sempre, um dia igual a todos os dias. Monótono, triste, chuvoso, nem parece Primavera. Estive a fazer promoção da Knorr no Manuel Nunes, em Famões. É uma acção sem brilho. Não há clientes. Ninguém tem dinheiro para compras. Seriam umas 11h. da manhã, quando a Joana, me telefonou. Disse-me que te tinha telefonado, só para ouvir a tua voz. Ela lá sabe. Disse-me que tinhas uma voz triste, e que lhe pareceste adoentado. Depois de sair do meu trabalho, fui á oficina com o carro, para saber quando lá o poderia pôr para arranjar. Só dia 2. Voltei para casa, cansada, e sem vontade de ver ou falar com alguém. Mas não me é possível, sentir um momento de desânimo, porque há sempre alguém que precisa dos meus fracos préstimos, e lá telefona a Joana, dizendo não saber carregar o telemóvel e a pedir a minha ajuda. De má vontade lá fui. Depois ela não quis ir para casa, pois achava que era muito cedo, apetecia-lhe ir petiscar qualquer coisa, lá fomos ao Duarte, comer umas petingas fritas, que por acaso até me souberam muito bem, mas me fizeram muito mal. A Joana insistiu, para que te telefonasse, assim fiz. Porém, se o arrependimento matasse, teria morrido na hora. Mas todo o mal tem um final passa depressa. Também assim aconteceu comigo. Seriam 21h quando o meu telélé tocou. Era o Aníbal, a perguntar se eu já tinha B.I. É que eu fiquei de lhe mandar fotocópia via fax, e ainda não o fiz. Perguntou-me onde estava, porque ele estava em santo António dos Cavaleiros. Disse-lhe. E mais, como ele já me tinha convidado para tomar café umas quantas vezes, desta vez convidei eu. Foi ter connosco. Petiscou. Depois fomos para casa da Joana. É uma pessoa agradável o Aníbal. Conversámos até ás 2 da manhã. Falámos de muitas coisas e de muita gente, incluindo a tua pessoa, como era de prever. Falámos sobretudo de trabalho. Ele tem umas quantas ideias, mas não é idiota, e sem ser ilusionista, também tem umas quantas ilusões. Não. Não me refiro a essas. Refiro-me a ilusões filosóficas e utópicas, de como gostaria de singrar na vida. A Joana, ficou até de lhe arranjar alguns contactos com empresas. Penso que agradaram um ao outro. Depois vim para casa. Sentei-me ao computador, a escrever as memórias do dia. Bem curtas por sinal. E foi assim. Até amanhã meu querido. Um beijo da (tua?) desmemoriada, LUISA 4ª feira dia 19 de Abril de 2000 Olá, quem? Não sei bem Depois de uma manhã, sem graça, e compartilhada com pessoas pouco agradáveis, liguei o telefone, e tinha uma mensagem tua. Milagre! No entanto, não percebi patavina do que dizias. Ouvi, tornei a ouvir, devia estar completamente estúpida, porque continuei sem perceber. Só percebi, que tinhas deixado qualquer coisa para mim com a Manela, qualquer coisa, que eu não iria gostar. Não entendi essa, mas está bem. Mais tarde liguei para ti, para ver se me explicavas, o que querias dizer, mas tu não te mostraste muito interessado. Achei uma certa graça, quando ao atenderes, possivelmente sem te dares conta, disseste, cá está a nossa amiga, pareceu-me ver uma certa ironia na tua voz. Possivelmente estaria enganada. Possivelmente? Perguntaste-me, entre outras coisas, se eu estaria feliz com a minha liberdade, e eu respondi, que a minha liberdade, era condicionada, pela minha consciência. Parece que não percebeste muito bem, o que eu teria querido dizer. Onde andam essas tão famosas antenas? Perdeste faculdades? Tudo me leva a crer que sim. Voltei de novo a ouvir a tua mensagem. Havia nela uma acusação de que eu me auto flagelava, que não entendi muito bem, e como quando eu não sei ou não percebo qualquer coisa, costumo perguntar a quem sabe, voltei a ligar para ti, para que me explicasses o que querias dizer. Porém, quando ias para atender, e possivelmente, possivelmente? Sem te dares conta mais uma vez, disseste: - cá está esta gaja outra vez! Como não quero ser chata, desliguei, bastante chateada, por acaso. Depois de ter falado com a Joana, sobre este assunto, ela falou contigo em resultado dessa conversa, deixei-te uma mensagem em que te peço para, Caso possas e queiras me ligues. Veremos o que farás. É tudo por hoje. Espero que durmas bem. Um beijo da gaja. LUISA 5ª feira 20 de abril de 2000 Olá, continuo sem saber bem o quê. Hoje foi um dia mais ou menos bom. O dia. Porque a noite... Depois de acabar o stok , mandaram-me para casa, pois não se justificava, estar na loja, não havendo mercadoria. Assim, saí e fui á CGD, e depois ao CPP, fazer umas transacções, quando ia a meio caminho, telefonas tu, a dizer-me que ias a Lisboa, e a propores-me um encontro. Claro que como sempre aceitei com satisfação. Fomos a Lisboa, depois disseste-me que tinhas que ir para casa, [porque tinhas deixado arroz-doce ao lume e podia queimar-me], mas entretanto, mais tarde virias á tua lição de [violador] e passarias cá por casa e possivelmente jantarias comigo, porém não tinhas a certeza disso. Ficaste com as certezas todas depois, e decidiste não jantar. Assim foi. E tudo estava bem. Foste embora, dizendo que lá para o S. António, nos voltaríamos a ver, talvez. Concordei. Que mais poderia fazer, contra factos e decisões não há argumentos, não é? Confesso, que não me agrada muito a ideia de não saber muito bem, qual é o meu papel, mas vamos vivendo e vendo, assim, como assim... Saíste, e como eu tinha feito um esforço muito grande para me manter calma e serena, fiquei arrasada. Deitei-me e adormeci. Como sempre, Sol de pouca dura. Não me é permitido dormir. O telefone toca. Ouvi, mas não me apeteceu atender. Era a Joana. Falou com a Manela. Ficou admirada, por eu ás 22h já estar a dormir, porque eu nunca durmo. Pediu até á Manela para ver se eu estaria bem. No entanto a Manela, está-se nas tintas, para que eu me sinta bem ou mal, a bem dizer, como já não precisa de mim... O Júlio, é que não sabendo das intenções dela, não percebendo que ela atendeu o telefone, ao ouvir este tocar, pensou que eu não estaria em casa, mas reparou que eu estava deitada e chamou-me. Aí, não tive outro remédio senão acordar claro. Alguns poucos minutos mais tarde, ligas tu, aflito por causa da tua irresponsabilidade de pai, em relação ao Ricardo. Pobre Ricardo, no meio de desmiolados como vocês, que não sabem ser gente, quanto mais pais...! O resto da história já sabes, não preciso contar mais nada. Só que depois de terem saído, me senti bastante mal. Mas não morri infelizmente, ainda tenho muito que chorar e rir. Boa noite. Luisa 6ª feira 21 de Abril de 2000 Depois de uma noite bastante atribulada, em que não dormi, e me senti bastante mal, em que me lembrei bastante do meu marido, mais velho, e de como ele se sentia antes de falecer, pensei até, que idiotice, se não seria ele a avisar-me do que me poderia acontecer, se eu teimasse em me relacionar contigo. Nunca uma noite foi tão grande. E uma manhã tão comprida. Telefonei á Joana que , nesta altura do campeonato, é a única com quem posso contar por enquanto, já se vê.! Aos trancos e barrancos, lá consegui ir ás compras para o almoço, e lá fui almoçar com ela. Depois dos acontecimentos de ontem, de ti não mereci nem um telefonema a dizer-me como estariam as coisas contigo! Soube que estava tudo bem, porque telefonei ao Ricardo. Pareceu-me calmo e sereno. Pobre Ricardo, já está habituado, coitado. Depois de almoço, senti-me pior do que durante a noite, uma dor forte no peito e nas costas, que me provocava vómitos, e se alongava para o braço, Fez-me pensar, se não iria ter um enfarte, a Joana assustou-se, e teve a infeliz ideia de te dizer, é burra todos os dias, podia ser só aos fins de semana, mas não é aos feriados e tudo. Depois de ir ao Catus, e ter sido medicada, voltei para casa, e graças a Deus, fiquei boa. Decidi então sair com a Joana, e a Regina. De ti nem uma palavra. Muito bem, aplaudo de pé. E este foi mais um dia do resto da minha vida. Espero que durmas bem, e sem cuidados. Só te peço, tem um pouco de respeito carinho e ternura pelo Ricardo, que não pediu para nascer, nem para ser castigado ao Inferno, pois ele não tem culpa se os pais não sabem ou não querem resolver os seus próprios problemas, e não vêm que ele é ainda um menino, que se sente só, e sem saber muito bem ao certo, para onde vai. Por favor cresçam. Já vão sendo horas de deixarem de olhar só para o vosso umbigo! Neste mundo cão, mas que também é de Deus, há mais pessoas, que também têm sentimentos, respeitem-nos. Por hoje é tudo. Estou como deves sentir, indignada. Luisa Sábado, 22 de Abril de 2000 Hoje é Sábado, depois de mais uma noite atribulada, consegui dormir, e durante esse pouco tempo, fui feliz. Também, eu só sou feliz a sonhar. Mas é preciso que esses sonhos me levem para bem longe, até á minha África, e a tudo o que de bom lá deixei, sobretudo a minha juventude. Mas sonhos são sonhos, e a realidade, é bem mais dura e ruim. Acordei ás 11h. De ti, nem sinal. Que é que eu poderia esperar? Nada!!! Telefonei á Joana, é só ela quem me resta a bem dizer. Ás 14.30h. fui arranjar o cabelo. Até a Cristina achou que eu não estava nos meus dias. Ao sair de lá, tive a (grata?) surpresa de te ver. Pouco falámos, tinhas como sempre a roupa no cloreto. Fui até à Joana, sempre a Joana, benza-a Deus! Decidimos, ir á nossa habitual noite de fados. Parece que aquela tonta, resolveu enquanto eu fui á casa de banho, convidar-te a ir também. Apareceste, e foi bom. Sobretudo porque me consegui livrar do melga que é o Vilaça, coitado, lá se foram as suas ilusões!... Foi uma noite morna, sem grandes acontecimentos, o maior dos quais, foi que, não sei porquê, toda a gente desafinou, a cantar, até a Rosinha e o Zé. Ficaste connosco até ás quatro da manhã, ou seriam 5? Eu tive que ficar em casa da Joana, porque burra que sou, esqueci-me das chaves em casa e a Manela só vem 2ª feira á noite, esta burricoide, chegou a lamentar não te ter dado já uma chave da minha casa, assim não teria que ficar na rua. Sou parva, porque dadas as circunstâncias, ficava na rua na mesma, já que, a roupa que tinhas na lixívia, podia estragar-se, e por isso não me virias trazer a chave. Ainda bem que não dei. Não dei nem darei, não mereces nem vale a pena. Porquê? Ainda tens a ousadia de perguntar? E foi assim o Sábado. Curto e sensaborão, veremos como será o domingo. Até lá. Luisa Domingo, 23 de Abril de 2000 Hoje foi Domingo de Páscoa. Fiquei em casa da Joana, como já era do conhecimento geral. Acordámos cedo. Fomos ás compras, ela estava esperançada em que o Agostinho viria almoçar, mas como eu, e tu, calculámos não veio. Homens...! Fomos até ao Infantado tomar café. O Zé Luiz foi connosco. Muito chateadas as duas, porém ela mais do que eu. Eu ainda era suficiente ingénua, para pensar que te lembrarias de mim, antes do dia acabar, parvoíces...! Ainda fomos tentar abri a minha porta, mas não conseguimos. Lembro-me que a Joana, te perguntou, se irias ficar sem dar notícias muito tempo, como tinhas feito, a semana passada, tu garantiste que não. Disseste que telefonarias. Mas o certo é que passou todo o dia, e de ti nem um sinal, o que a ela incomoda mais do que a mim. Á noite depois do jantar, a Joana pediu-me para lhe cantar um fado, cantei mais do que um,. Fomos deitar era quase 1h. da manhã. Ela dormiu logo. Eu como sempre fiquei de plantão a fazer versos á Lua. Ainda te mandei uma mensagem, não sei se a recebeste. Também não estou muito preocupada com isso. Sinto até, que os nós que me atavam a ti, estão muito mais lassos e fáceis de desatar. São nesta altura 5h da manhã de 2ª feira, que será mais um dia que passarei, fora da minha casa. Por hoje é tudo. Espero que passes muito bem. Até amanhã. Luisa 2ª feira 24 de Abril de 2000 e como eu prometi, não sei ainda porquê, nem se valerá a pena, cá estou a contar mais algumas coisas dos meus dias sem sabor, nem cor. Acho que não tenho mais nada a dizer. O meu diário finda aqui, pois aqui findou também toda a nossa atribulada relação amorosa. Luísa, uma mulher livre e feliz

A DAMA DO MONTE

Não estava lá! Ainda não tinha chegado Aquela paisagem agreste e linda, sem ela perdia todo o encanto. Fazia falta, sentada naquela pedra, com o olhar vago, perdido na planície...! Mas quem fazia falta?- perguntarão. Ela! Era ela, quem fazia falta ali no monte, ela que fazia parte daquela linda e agreste paisagem. Era uma senhora de meia idade; ainda se podiam ver nela, vestígios de uma beleza, que, havia já algum tempo tinha perdido o fulgor. Quem visitasse o monte da Piedade, num Sábado aquela hora, decerto a veria, ensimesmada, com o olhar perdido em longínquas paragens. Quem sabe, se recordando momentos felizes da sua juventude?! Ás vezes quando a observava mais atentamente, notava-lhe nos lábios um sorriso enigmático, enquanto lágrimas cristalinas lhe deslizavam pelo rosto, sereno, sem uma contracção ou franzimento. Que recordaria ela? Que acontecimento no seu passado, a faria chorar e sorrir em simultâneo? Outras vezes, com um caderno assente no colo, escrevia...escrevia, quase em frenesim como se quisesse agarrar as lembranças antes que estas desaparecessem. Qualquer que a visse, sentia uma enorme curiosidade... Quem seria? Como se chamava? De onde vinha? Quando acabava de despejar os seus pensamentos para a folhas brancas do seu caderno, a Dama do Monte, levantava-se, olhava em redor com um olhar sonhador, alisava mecanicamente o cabelo e a saia e entrava no seu velho carro arrancando suavemente, como que tendo pena de deixar o monte e a calma que nele reina...! Nós, olhava-mos para ela de longe. Aquela senhora parecia-nos uma miragem inacessível. Pensava-mos todos, que, se nos aproximasse-mos ela se esfumaria no espaço e nunca mais a veríamos ali. Para nós era impensável o Monte da Piedade sem a Dama misteriosa. Se isso acontecesse, toda a magia e encanto daquele lugar desapareceria. Tinha chegado a Primavera. Os dias tornaram-se maiores e mais soalheiros. Nós aguardávamos a chegada da enigmática senhora. Os últimos dias tinham sido de muita chuva, por isso não podemos sair e passear pelo Monte, a nossa esperança era que também a velha senhora não tivesse ido, e que portanto, viesse hoje. Sentados na escadaria da Igreja, esperava-mos que o velho Fiat aparecesse na curva da estrada, mas já a tarde declinava, e do carro nem vestígios...! Olhavamo-nos interrogadoramente, viria? Não nos atrevia-mos a sair dali. E se ela viesse e nós não a víssemos? Tinha-mos decidido que quando ela chegasse nos havíamos de aproximar e tentar falar-lhe. Muito agitada a Sara afirmava: - Eu não lhes dizia? É uma fada! Como adivinhou que queríamos falar-lhe desapareceu...... O André muito senhor dos seus conhecimentos espaciais respondeu: - Que fada que nada! Veio de outro planeta. Eu bem vi quando um ovni aqui desceu e ela saiu! Eu estava sentado na janela do meu quarto. Era uma noite muito escura, só se viam as luzes da nave. Abriu-se uma porta e a Senhora saíu envolta numa cortina de fumo, que eu bem vi!!! O André quase gritava perante o meu olhar de dúvida e o meu sorriso trocista.... - Ninguém pode duvidar do que vejo, ninguém!!! A Sara esticava o pescoço para espreitar a estrada, mas nada, nem carro nem senhora.....nada! Timidamente a Sofia comenta: - Mas que ideia a nossa querermos falar com ela. E tudo só por causa de um cão sem dono.....Agora já não vem mais....! E se....se? - Se o quê Sofia? – pergunta o André de cenho franzido - Se ela...? - ??????? - se ela morreu! Pronto já disse. – A Sofia corou como se tivesse dito um palavrão. - - nem penses uma coisa dessas! – dissemos todos em coro. - Isso não pode ter acontecido.....seria o fim... E tão agitados estávamos, gritando um mais do que o outro, que só parámos quando ouvimos uma vós calma e doce que perguntava: - Seria o fim de quê garotos? Silêncio. Olhamos todos como que enfeitiçados e, lá estava ela a Dama do Monte sorridente, com um pequeno ramo de flores silvestres na mão? Afinal ela falava – pensamos maravilhados. Um pouco a medo, mas mais afoita do que nós, a Sofia aproximou-se e pegou-lhe na mão. Apalpou-lhe a saia branca de seda plissada, parecia não acreditar que fosse verdadeira.... De onde saíra? Nenhum de nós ouvira qualquer barulho, nem carro nem passos, nada... A Sara olhava-nos zombeteira, como que a dizer-nos: É ou não uma fada? Vêm? Eu é que tenho razão! Enquanto o André pensava: - Só um extraterrestre pode aparecer assim sem ninguém dar por isso.... Sendo eu a mais velha do grupo, tomei para mim a responsabilidade de iniciar a conversa com a, para nós, misteriosa senhora. Boa tarde minha senhora, como está hoje? – perguntei com um sorriso que me apanhava a cara toda. - Hoje como sempre, estou bem, muito obrigada. – responde ela suavemente sorrindo. - Desculpe, disse eu, estávamos falando de si. - De mim? Quanta honra! – responde com ar divertido. - E que falavam? Olhámos uns para os outros. E agora? O que devíamos de dizer? Mais uma vez foi a inocente Sofia quem disse: - é que a senhora não estava no sítio do costume, nós não a vimos e receámos que..... Sofia parecia ter-se engasgado. André foi em seu auxílio, pensámos que a senhora tivesse.....morrido diz a Sara, como se atirasse com uma porta. Trás! E porque seria o fim? E o fim de quê alem do meu?- pasmem ela deu uma gargalhada. Sabia rir como nós! Bem comecei a dizer, nós costumamos vê-la quando se senta naquela pedra a olhar lá para baixo sem se mexer, ou quando escreve. Para nós a sra. Tem muito encanto e magia; então decidimos que quando cá voltasse tentaríamos falar-lhe saber quem era, donde vinha, enfim... sabe como é?- ufa! Que discurso! Sentia-me aliviada. Conseguira dizer tudo de um só fôlego.. Muito bem. Diz a Dama; e que querem saber? Estou pronta a responder ao vosso interrogatório. - Verdade?- Perguntámos em coro. - Verdade, verdadinha, verdadeira, responde risonha sentando-se connosco na escadaria. Então posso começar? – pergunto um tanto ou quanto duvidosa. Sim. – responde- podes começar. Então lá vai. Como se chama? De onde é? É uma fada? Uma extraterrestre? Sorrindo ela diz: O que para aí vai! Calma, vamos devagar. Como me chamo? O meu nome é Dulce. Não. Não sou uma fada e também não sou uma extraterrestre. Então?- pergunta a Sara arregalando os seus bonitos olhos azuis. - Porquê tanto interesse na minha pessoa? Senti os olhos de todos fixos em mim, como dizendo:- vamos Marta faz tu as perguntas. Muito educadamente e tímida Sofia diz: - Primeiro deixe que nos apresentemos, eu sou a Sofia, tenho 8 anos e ando no 3º ano, esta é a Sara, tem 10 anos e está no 6º ano, aquela é a Marta, tem 13 anos está no 8º e o André também tem 13 anos e também está no 8º ano. Somos todos amigos. Abençoada Sofia sempre educada e atenciosa, sendo a mais nova era sem dúvida a mais atenta e a mais calma..... e continua: - Sabe sra. D. Dulce, nós costumamos vir para aqui andar de bicicleta aos fins de semana, depois de fazermos os trabalhos de casa. E sempre á mesma hora, vemos a sra. Sentada, imóvel naquela pedra.... A Sara apressadamente diz: - parecia uma estátua, até ao dia em que aquele grande cão amarelo, se aproximou deitou a cabeça no seu colo, e, a senhora lhe fez festas. - O que tem isso de estranho? Inquiriu ela suavemente - Nada - digo eu – fazer festas a um cão, nada tem de estranho. A senhora é que é estranha... - Sou? Nunca tinha dado por isso, diz soltando uma gargalhada. Atónitos nem queríamos acreditar que ela risse exactamente como nós. Olhámos para ela e pareceu-nos de repente que ela se transformara numa jovem da nossa idade rindo e galhofando connosco. Então ela contou que tinha estado em África, que era viúva, que tinha filhos, que tinha netos, que....que....que...uma infinidade de histórias. Ensinou-nos adivinhas: - o que é que é que vai deitado e vem em pé? – É um cântaro! – nenhum de nós sabia o que era um cântaro, nem a candeia que enche a casa até á telha; e, muito menos o que era uma nora com alcatruzes; mas lá que era divertido era. Rindo e brincando, não demos pelo tempo passar. Já eram perto das dez horas da noite quando ela diz:- bem meus queridos, são horas de regressar a penates! E, levantando-se, deu-nos um beijo quente e terno; depois seguiu para o lado de trás da Igreja e desapareceu. Ficámos estáticos, a vê-la desaparecer...... De repente o André diz quase gritando: - Regressar a Penates! É isso! Eu bem tinha razão. - Razão? Porquê? Em quê?- Perguntamos todas á uma. - Nunca ouviram fala em Penates? – são mesmo estúpidas – toda a gente já ouviu falar! Estávamos aturdidas, que raio seria Penates? Doutoralmente o André explicou: - Penates é um planeta satélite da Lua, da Terra e de Marte. - É? Mas nunca nos falaram dele...! só conhecemos nove. E começámos: Mercúrio, Vénus, Terra, Marte....... - Afinal eu tinha razão. Continua o André. A Dama do Monte é uma extraterrestre. Não contestámos. Para quê? Era muito mais bonito ficarmos a pensar que ela era um ser irreal etéreo, do que uma simples mortal de carne e osso como nós. Fomos para casa. Tomei um duche e deitei-me. Adormeci e sonhei que estava em Penates ao lado da linda e misteriosa Dama do Monte...... Penates era um planeta lindo...! Muito verdinho........com muitas flores. E lá, as pessoas não caminhavam no chão, flutuavam como se fossem nuvens no espaço....... Uma coisa assim só mesmo em Penates, diria o André, se podesse ver o meu sonho. Piedade, 13 de Abril de 2001 Maria Isabel Galveias

RECORDAR É VIVER


Hoje fui a uma entrevista a fim de arranjar um emprego, para as minhas horas livres. Foi uma autentica romaria de saudade. A entrevista era nos Olivais. Olivais Sul como agora é designado. No tempo em que lá vivi, era Olivais somente..... Teria que estar ás 13h no n.º 56 da rua Cidade da Beira. Não sabia onde era, no meu tempo por ali só havia quintas, e oliveiras. Fui cedo, para descobrir o local, e, chegar a horas á entrevista, perguntei ao motorista da Carris, onde ficava a dita rua, ele parecia não saber ao certo. Nesta bem fadada terra, se alguém souber alguma coisa vai preso, por certo. Desci do autocarro, na rua de Nampula, passei nas ruas de Quelimane, João Belo, Lourenço Marques, Inhambane.......No espaço de uma hora percorri, Moçambique do Rovuma ao Maputo, até que chaguei á rua Cidade da Beira. Esta rua fica perto do lindo Vale do Silêncio, esse sim, é do meu tempo. Para fazer tempo, pois era ainda muito cedo, entrei num café, e, quando estava tomando a minha bica, entrou um senhor, muito bem disposto e galhofeiro. A empregada começou a brincar com ele, e, ele acabou por dizer que tinha 80 anos. (Não lhe daria mais de 50) Como boa Moçambique, logo entrei na conversa, perguntando se ele era daqueles sítios, ao que ele respondeu: - Sou aqui nascido e criado minha senhora, já lá vão 80 anos.... - Então, deve lembrar-se da Quinta dos Serrões... - Se me lembro! Havia lá uma fábrica de Curtumes, trabalhei lá - Conheceu portanto, o meu avô, ele era o encarregado da fábrica. - Se conheci. Era boa praça esse sr. Paulino, era assim o nome dele não era? - Era sim. Eu fui para essa quinta, quando tinha 18 meses, vivi lá até perto dos 14 anos.... - Ai minha senhora, isso é que eram tempos...! - É verdade! Sabe? Estes Olivais de hoje não me dizem nada, já nem sei onde estou. - Aqui é a quinta do Patacão, lembra-se? - Lembro sim, vim muitas vezes aqui apanhar caracóis, com a Rosita da Alaguesa. - A Rosita? A senhora conheceu a Rosita? - Sim. Fomos criadas juntas. Nunca mais a vi! - Ela mora na Rua Alves Gouveia vejo-a muitas vezes. - Quando estiver com ela, diga-lhe por favor, que encontrou a Belinha dos Serrões, e que ela lhe manda um grande abraço está bem? - Minha senhora, ainda hoje lhe vou dar esse abraço, fique descansada! - O senhor lembra-se, dos bailaricos dos Santos Populares, que havia no Rossio? (Largo da Viscondessa) - Se me lembro... Eram outros tempos. Quantas vezes lá ouvimos os Lírios, no tempo do Jacinto Lopes... - É verdade. Ele cantava tão bem! Havia também os Mensageiros do Ritmo, com o João Loureiro....Era a época do give, das rumbas, o xa-xa-xa, o tango, enfim nesses tempos não eram ainda consideradas danças de salão, dançavam-se em todos os bailaricos... - Minha senhora, nem imagina, quanto me alegro, por poder falar desses tempos, com quem os viveu...Esta mocidade de agora, tem tudo o que nós não tivemos, mas com tanta coisa, que nem sabíamos que existia, nós fomos muito mais felizes. Fala-se da fome que se passava nesse tempo...Eu nunca tive fome! Haviam tantas árvores de fruta, e fruta da boa, sem corantes nem conservantes, como a de agora. Ia-mos á xinxada, e enchia-mos a barriga. Os donos faziam de conta que não nos viam, e no fundo era a maneira da rapaziada se divertir. Não havia droga, nem nada disto que o dito progresso nos trouxe. Eram quase horas da minha entrevista. Com alguma pena, pois havia ainda tanta coisa a recordar ,despedi-me do senhor, dizendo: - Bem tenho de ir. Talvez nos encontremos por aqui mais vezes. - Aí minha senhora. Oxalá assim seja. Hoje foi um dos dias mais felizes que tive. É tão bom recordar o passado! O senhor tinha lágrimas nos olhos, e eu também. Afinal, não sou só eu que tenho saudades, há mais quem tenha. Acrescento, que consegui o tal emprego. Fico duas vezes feliz. Uma porque o consegui, outra porque vou ter oportunidade de voltar a ver aquele senhor, que tanto gosta, como eu, de recordar o nosso lindo bairro dos Olivais, quando ele tinha realmente oliveiras, e, muitas quintas, com alegres camponesas, com quem eu cantava ao desafio. Foi um lindo dia para mim..... Arroja-21-7-2004 Maria Isabel Galveias

ROSALINDA

Rosalinda..., como o destino fora irónico.... Quem lhe pôs semelhante nome, não reparou por certo, o quanto ela não era Rosa, e muito menos linda,bem pelo contrário. Era um moça gorda, disforme, com um rosto a atirar para o grotesco, somente os seus olhos eram lindos, sim, os olhos de Rosalinda eram dum cambiante de cores entre o azul, e o verde, passando ocasionalmente pelo cinza. Expressivos, risonhos, francos, sinceros e amigos, mas era tudo. Embora feia, Rosalinda era uma garota amorosa, amava tudo e todos, amava qualquer coisa, só não amava a si própria. Tinha vivido na esperança de encontrar alguém que a amasse, risonhamente dizia: -Conheço tantas mulheres feias, gordas e desengonçadas que arranjam quem as ame,porque não hei de eu arranjar alguém? Só que o tempo passou, conheceu alguns rapazes que lhe juraram amor, porém todos se aproveitaram do seu doce coração, usaram e abusaram da sua bondade, e partiram, deixando Rosalinda, triste, inconsolável na sua solidão. Quem conheceu Rosalinda, de perto, como eu, teve por certo ocasião de perceber, que, por detrás daquela figura quase grotesca, se alojava uma alma linda, doce e sensível, abnegada, capaz dos maiores sacrifícios para ajudar quem lhe estava próximo; O seu olhar meigo, apenas pedia um pouco de amor, mas nunca o conseguiu de ninguém. E lá foi vivendo Rosalinda, vendo os dias passando, o tempo se escoando, sem ter alguém que lhe desse o devido apreço. Inteligente, com uma cultura geral apreciável, era de certa forma invejada pelas colegas, que muitas vezes se valiam do seu valor, para em circunstâncias várias serem por ela auxiliadas. Pobre Rosalinda, quando precisava de auxílio, estava sempre sozinha, só comigo contava, só comigo desabafava, eu era a sua única amiga, desde os bancos da escola. Chegaram as novas tecnologias, e, Rosalinda, acompanhou a evolução dos tempos. Curiosa, enquanto não aprendeu a mexer nos computadores, não descansou. Veio a internet, e, lá estava Rosalinda na vanguarda..... A net era a sua companhia, lá conheceu muita gente, e, curiosamente, encontrou quem a amasse... Pudera dizia risonha, não me conhecem... Espantoso, quem a conheceu através da net, achava Rosalinda uma mulher linda.... Teve vários pretendentes, com todos flertou, brincou e se divertiu. Rápida na resposta, inteligente no uso das palavras, era o encanto e a força motriz de qualquer sala de conversa, dinamizava tudo e todos. Pediam-lhe fotos, e aí, ao verem aquele rosto grotesco onde só os olhos brilhavam, houve alguns que continuaram sendo seus amigos, mas os namorados, esses deixavam de lhe escrever.....embora ela não os levasse a sério, sofria com a atitude deles. Um dia, um pediu-lhe para falar com ela no messenger, ela acedeu. Ele falava-lhe de amor, com tanta ternura, que, ela sem querer se deixou envolver, apaixonando-se de verdade. Ele vira as fotos dela, e continuava a falar de amor. Rosalinda, sonhou então, que finalmente encontrara a forma do seu sapato. Vivia empolgada, anelante, esperando a hora dele chegar e lhe falar daquele amor tão sonhado. Era feliz. Tão feliz, que, eu, não fui capaz de a contradizer e aconselhar, nem ela admitia conselhos, nunca a vira tão entusiasmada com alguém. Até que um dia, ela esperou, mas ele não apareceu. Qualquer coisa o impediu, dizia ela, não querendo acreditar que lhe mentira, que fora mais um que com ela brincara. Passou o tempo, ela todos os dias aquela hora de sempre lá estava. Mas ele não aparecia. Nunca mais apareceu. Desesperada, telefonou-me a chorar, dizendo: Amiga, porque me fez isto? Eu não pedi nada, nem o conhecia, porque brincou assim com os meus sentimentos mais puros? Nunca a vira assim. Ontem, telefonou-me uma vizinha de Rosalinda, preocupada, pois já não a via há alguns dias. Telefonei-lhe, em vão, ninguém me atendeu, aflita, fui a sua casa, chamei os bombeiros e a polícia, arrombamos a porta, e lá estava Rosalinda, deitada na sua cama, inerte, morta. Havia uma tal paz no seu rosto, que, paradoxalmente, estava bonito. A morte dera razão ao nome de Rosalinda. Aquele amor cibernético, que a iludira e lhe mentira, foi a gota de água, no seu cálice de amargura, pusera fim á sua triste vida.... Como as pessoas, podem ser más e ignorantes.... Como se podem esquecer, que, para lá da tela, há certamente alguém, que embora tratado com virtualidade, não é tão virtual assim. Existem para além da tela, pessoas, com uma alma e um coração, e, se alguém se apaixona por essa alma e esse coração, porque se importam com o "envelope" que os envolve? Rosalinda, não era Rosa nem Linda, por fora.... Mas era uma Rosalinda por dentro........... Pena ninguém ter reparado! Arroja, 31 de Julho de 2004 Maria Isabel Galveias

FIDILIDADE

Era uma tarde de Verão, já perto do crepúsculo, sentados á porta de minha casa, estavam os meus pais, o Zé Simões e o Libanio . Tinham acabado as festas de Stº António. Estavam todos muito animados. Cada um contava uma graçola. Eu estava como sempre afastada do grupo. Aquelas conversas sem consistência não me interessavam. Subitamente, aparece um cão perdigueiro, castanho como uma estrela branca na testa. Aproximou-se de mim, como quem pede amizade. Fiz-lhe uma festa, perante o olhar horrorizado de todos, pois o animal era estranho e podia morder-me. Mas não, começou a abanar a cauda, e a repuxar os beiços, como querendo rir. Notando este movimento, o Libeneo comenta: - Ó sor Galveias, já viu este cão? Parece que está a rir... - Como se chamará ele, pergunta meu pai. O Libeneo, começa então a dizer alguns nomes, o cão respondeu ao nome Tejo. - É Tejo sor Galveias, diz o Libeneo todo contente por ter “adivinhado” o nome do cão. Ri-te Tejo! Ri-te, e o Tejo ria-se.... Tejo, foi adoptado, mais por mim que pelos meu pais, e lá ficou em nossa casa. Era muito meu amigo. Lembro-me que o meu pai de manhã, vinha para o Monte e chamava-o, ele ia; Chegados lá, o meu pai punha-lhe o saco do pão e o jornal na boca dizendo: - Vá, vai levar á menina, e o Tejo lá vinha, correndo, para me entregar a encomenda; devo salientar que, a dita só a mim era entregue, pois ele não a dava a mais ninguém. Quando eu pegava no meu cobertor e no livro, ele já sabia, começava a abanar o rabo e corria em direcção ao montado, direitinho ao sobreiro onde eu costumava sentar-me a ler, e ali ficava deitado, com a cabeça entre a patas, até á hora de regressarmos. Recordo, que um dia adormeci. Acordei com os latidos do Tejo, que ao tempo que ladrava, me puxava uma manga, acordei e que vi eu? Um lagarto, tão assustado, como eu fiquei, e como o Tejo estava, julgo que receando que o lagarto me fizesse mal, pobre bichinho....nem se mexia. Ás vezes, eu ia até ao Monte, o meu pai logo que via o Tejo dizia: - Vem aí a minha filha, já aqui está o cão, ela não deve estar longe. Muitas vezes, a minha mãe, que era muito doente, tinha que ficar hospitalizada, meu pai saía por vezes durante uma semana, eu ficava sozinha em casa. Sozinha não, o Tejo estava sempre comigo, entrava em casa, deitava-se aos pés da cama e, era o meu guardião. Se eu saísse já depois de escurecer, e, ele visse algum vulto, ou luz de bicicleta, começava logo a rosnar...Nem os meus pais podiam levantar-me a voz, o Tejo não gostava. Um dia em que o meu pai levantou a mão pra me bater, ele quase o mordeu. Foi o Tejo, o meu companheiro durante muito tempo. Já não sei quanto, um ano dois, não me lembro. Um dia, aquele que viria a ser meu marido, foi lá a casa, ao ver o cão disse: - De onde veio este cão? - Não sei, responde o meu pai, apareceu aí, afeiçoou-se á minha filha e não a larga pra onde quer que ela vá. - Este cão, é do meu primo Alfredo Maneta. Ele tem andado doido á procura dele, até ofereceu uma recompensa a quem o encontrasse, amanhã já lhe digo que o cão está aqui. - É pá, diz meu pai, tens a certeza? É que o animal, parecia não ter dono, é estranho, os animais sabem sempre o caminho de casa, principalmente os cães. - Tenho a certeza, respondeu o “meu futuro marido” - No dia seguinte lá apareceu o dono do cão. Tejo não se mostrou muito contente, quase o ignorou. Porém, o dono chamou-o: Nero! (ao ouvir aquele nome pensei que aos ouvidos dele, Tejo era o nome mais parecido com Nero) Vem ao dono. Um pouco triste ele lá foi para casa do dono. Eu fiquei muito triste. O meu fiel amigo fora embora. Um dia, oiço uns latidos de alegria, era o Tejo. Chegou-se a mim, lambeu-me as mãos e o rosto, gania e latia de contentamento. Ficou uns dias, depois foi-se embora. Aconteceu assim durante muito tempo...Ia e vinha, sem que o chamasse ou mandasse embora. Até que numa das suas viagens, foi atropelado por um camião e morreu. Chorei muito. Ainda hoje me vêm lágrimas aos olhos, quando lembro aquele amigo, fiel, que, nunca mais se esqueceu de mim., ao contrário do que acontecia em relação ao seu verdadeiro dono.... Arroja, 16 de Julho de 2004 Maria Isabel Galveias
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quinta-feira, janeiro 04, 2007

SIMBIOSE

Tinha sido um dia, daqueles!!! Um dia em que tudo me fazia lembrar os bons momentos já passados, e, me fazia sentir uma enorme solidão, um enorme desejo de amar e ser amada. Á noite, estive como de costume, agarrada ao meu companheiro fiel, o meu PC. Porém, por qualquer circuntãncia, estava inquieta. Era meia noite. .algo me impeliu a sair. Ir até ao meu monte mágico, aquele onde tudo me parece perfeito, e, onde eu consigo acamalmar e retemperar forças. Carregar as baterias como eu costumo dizer. Como sempre tudo era calma e magia. Aquele lugar tem para mim , o fascinio do sonho. Fiquei dentro do meu carro a olhar as estrelas, que não sei porquê , ali parecem ser maiores, mais lindas e com mais luz. De súbito, os meus olhos fixaram-se numa, que parecia se r, de todas a maior, a mais brilhante, como se sírius se estivesse a dirigir a mim. Começou descendo, descendo, e quando estava já perto muito perto, tu desceste dela envolto numa luz azul incandescente. Olhei-te e verifiquei que tinhas os braços estendidos para mim, como numa súplica de entendimento, de simbiose, de ternura e de sonho. Aproximáste-te, demos as mãos, ficamos ambos estáticos olhando-nos, sem falar, apenas as nossas mãos se apertavam e os nossos dedos se entrelassaram, como se fossem membros do mesmo corpo. Um só corpo. Começas-te a puxar-me , em direcção á estrela brilhante, eu, sentia uma leveza e uma calma, como não sentia há muito tempo. Só nessa altura a tua voz suave, terna e doce me disse baixinho: - vem! Não receies. Verás que no nosso mundo de encanto e magia,tudo é como tu gostas. Lá só existe o sonho etéreo Onde tudo é perfeito. Vem! Eu deixei-me conduzir por ti, como que deslizando no espaço, fomos os dois sem palavras, subindo....... .subindo, olhava para baixo e via o meu monte cada vez mais longe.... Longe.....longe........ De súbito uma luz mais forte me feriu a vista, fazendo-me piscar os olhos, então deixei de sentir a tua mão na minha. Pareceu-me cair com brusquidão num poço, onde , sem saber como, magoei um braço. Abri os olhos, era dia. O sol iluminava-me.fora ele que m me acordara, tinha passado a noite no meu carro adormecida sobre o volante, daí a dor no braço. Além da dor no braço, senti mais aguda a dor da solidão, e, a tristeza de que só existe simbiose perfeita no sonho. Lágrimas cristalinas corriam-me nas faces, não eram de tristeza, eram pela felicidade plena sentida nessa nóite, com o contacto amigo da tua mão, fazendo-me sentir querida e importante. Pela primeira vez na vida, alguém tinha querido partilhar comigo, toda a magia , sentida numa simbiose perfeita. Por esta noite mágica te ficarei eternamente grata................ Maria Gsabel Galveias Piedade, 12 de novembro de 2000