sábado, julho 07, 2007

INDECISÕES

Não pode ser! Isto é uma loucura! Não é possível! Amanhã vou por tudo em pratos limpos. Vociferava Luís Miguel andando de um lado para o outro, parecendo um tigre enjaulado. Subitamente para em frente ao espelho do guarda fatos, e, fazendo um ar muito austero e compenetrado diz: - Laura tenho algo de importante a dizer-te. O nosso romance chegou ao fim. Já não te amo. Tu com as tuas maneiras bruscas acabaste com o nosso amor. Ponto final e acabou-se. Luís e Laura conheceram-se três anos antes numa festa de aniversário. Tinha sido amor á primeira vista. Ao fim de dois meses de se conhecerem resolveram partilhar as suas vidas e o seu apartamento. Foram três anos de felicidade, com algumas questiúnculas pelo meio como é natural, entre qualquer casal. Mas agora Luís estava cansado. Via todos os seus amigos com uma vida completamente livre, e, ele sentia-se preso. Acorrentado a Laura que o seguia para todo lado, como é usual entre qualquer casal que se ama. Só que Luís chegara á conclusão de que não amava mais a companheira. Assim resolveu ter uma conversa com ela, e, dizer-lhe duma vez por todas que o seu romance tinha acabado. Faria isso no dia seguinte. Laura era enfermeira, uma moça bonita elegante, de grandes olhos castanhos, com um olhar dulcíssimo. Amava Luís quase com idolatria, e, sentia-se a mulher mais feliz do mundo. Afinal Luís era aquilo a que na gíria se chama um pão. Alto robusto, de rosto oval moreno, onde brilhavam uns olhos pretos que Laura achava serem mais lindos que estrelas. Sentia-se invejada pelas companheiras. Naquele dia, chegou a casa, e para sua surpresa tinha a mesa posta, com duas velas acesas, e uma jarra com um lindo ramo de rosas vermelhas. Ficou surpreendida, pois não esperava aquele acolhimento por parte do seu amado companheiro. Sorridente foi até á cozinha, onde ele se esmerava a fazer o jantar, sorriu-lhe beijou-o e alegremente perguntou: - Então querido o que festejamos hoje? Ao que ele respondeu meio sisudo: - Tenho algo de importante para te comunicar. - Ah sim? Então vou tomar banho num instante enquanto acabas o jantar. Venho cansadíssima, hoje tive um dia para esquecer. Vai saber-me bem ficar em casa a conversar contigo. Alegremente lá foi para o seu banho. Entretanto Luís murmurava entre dentes tudo o que tinha para lhe dizer “ pois minha querida estou farto acabou-se. Vou deixar-te. E cada um vai seguir rumos diferentes, espero que continuemos amigos, afinal já há três anos que vivemos juntos. Nenhum de nós pode encontrar melhor amigo, não concordas? Já tinha posto o jantar na mesa, e o espumante no gelo, quando ela alegre e feliz chega á cozinha. Vinha de roupão, o cabelo ainda molhado preso num rabo de cavalo, o que lhe fazia sobressair a beleza natural do rosto. Destapou a travessa e quase gritou: Lagosta? Deve ser algo de muito importante o que me vais dizer. Deixa-me adivinhar foste finalmente promovido a director? Dizendo isto sentou-se. Luís sentou-se em frente dela, encheu uma taça de espumante e começou: - Laura, a nossa vida vai ter de mudar. Não consigo mais viver contigo…. -Ao ouvir aquilo ela fica de olhos muito abertos, já com algumas lágrimas a quererem saltar. Parou de comer, fitando-o com um ar estarrecido. -Não podemos continuar assim. Não consigo viver contigo nesta situação, temos que mudar de vida…. Nesta altura ela salta da cadeira, corre para ele, abraça-o beija-o e diz-lhe: -Puxa, quase me assustaste. Neste momento o telefone toca, Laura vai atender, era sua amiga Constança, a perguntar se queriam ir ao cinema. Eufórica Laura responde: -Hoje não querida! Aconteceu uma coisa maravilhosa! O Luís pediu-me em casamento agora mesmo. Luís fica atónito ao ouvir aquilo e diz-lhe de longe: -Laura espera estás a fazer…. Pois foi Constança, continua Laura, foi uma surpresa. Ele é um querido. Foi um pedido feito com todo o requinte imagina que até fez lagosta para o jantar. Foi uma surpresa. Está bem querida, então até já. Pousou o telefone, e diz para um Luís completamente aparvalhado: -Querido, a Constança vem aí com mais alguns amigos. Mas Laura ….ia ele tentar explicar, mas, toca o telefone de novo, e Laura atende: -Olá mãe! Boa noite! Está tudo bem sim, tenho uma notícia espantosa para te contar. Claro que é boa, nem podia ser melhor, eu e o Luís vamos casar!! -Que bom minha filha! Eu e o pai vamos já para aí, temos de festejar, e já agora digo á tua irmã, não te preocupes se não tens jantar que chegue nós levamos. -Está bem mãe. Ficamos á espera Olha querido, diz ela radiante, os meus pais e a minha irmã também vem festejar este belo acontecimento connosco. Não é maravilhoso? Vou telefonar aos teus pais, não seria bonito não lhes dizer não achas? Laura parecia um torvelinho. -Mas Laura…qual quê? Laura já estava a falar com sua mãe. Olá D. Joana! Boa noite! Não nada de mal, antes pelo contrário, venham até cá, estamos a festejar. O Luís resolveu propor-me casamento. Sim, sim. Cá os esperamos então. Temos sim, hoje até há lagosta, deu uma gargalhada feliz. Claro que foi, o seu filho é um verdadeiro cavalheiro. Ok então até já. Mais uma vez, Luís tentou chamá-la á razão dizendo: -Laura estás a fazer uma enorme….. Toca a campainha da porta, ele vai abrir e, de supetão sente-se abraçado, beijado, e quase levado no ar por Constança e os amigos. Parabens! Gritavam todos quase em coro. Já não era sem tempo! Luís não sabia já, onde estava coitado, levado por aquele vendaval de gente. Entretanto chegaram os pais de ambos, e foi um esfuziante alarido. O sr. Geraldo pai de Luís abraçou-o dizendo: -Estou muito feliz filho. Já pensava que serias como os rapazes de agora, que fazem casa, constróem família, mas tudo sem ser devidamente formalizado com o casamento. E, não te preocupes, já que decidiste e muito bem, nós pagamos todas as despesas. E entre espumante, lagosta, frango assado, batatas fritas, cerveja, pasteis de bacalhau, a festa continuou animada para os mais jovens; enquanto os pais dos noivos, conversavam sobre os preparativos do casamento. Pobre Luís apanhado naquele furacão, nem sabia já o que dizer. Apenas se deixou levar. Ele há coisas! Ficou logo decidido que o casamento, simples, só com os amigos mais próximos seria dali a um mês, era só o tempo dos preparativos. Aquele mês passou, numa roda viva. Luís mal tinha tempo para pensar. E aqui estava ele, passeando dum lado para o outro, decidido a desmistificar toda aquela trapalhada. Ainda pensou consigo: vão-me matar. Vão chamar-me tudo e mais alguma coisa. Mas casar eu não caso. Isso nem morto. Gastaram dinheiro? Quem lhe encomendou o sermão? E Laura? Que culpa tenho dela ter compreendido mal e não me deixar explicar? Pior para ela. Mas eu não caso. Era o que faltava! Ficara decidido que Laura sairia de casa dos pais, juntamente com estes e Constança, já que esta ia ser sua madrinha, Luís sairia da casa onde viviam, acompanhado dos pais e de Lurdes irmã de Laura, que fizera questão de amadrinhar o cunhado. Tudo pronto, já em cima da hora, e, Luís não havia maneira de sair do quarto. Mais uma vez olhou em redor, dizendo: - Adeus. Vou e não volto mais. Só venho buscar as minhas malas, que felizmente estão feitas. Pensavam que era para sair em lua de mel? Pois enganam-se. Não vai haver lua de mel. Ou por outra vai haver sim, mas só para mim…os outros…quero lá saber dos outros? Alguém me perguntou alguma coisa? Ouviu bater á porta, era a cunhada chamando-o: - Vamos Luís! Aposto que a minha irmã não demora tanto a vestir-se. Até parece que estás com medo. A porta abriu-se, e José namorado de Lurdes diz-lhe a rir, anda lá pá. Estás com medo? Isso é comum a todos os felizes noivos. Por isso é que eu não me caso! E deu uma gargalhada, que deixou Luís ainda mais indisposto. Empurrão daqui, empurrão dali, lá foi até ao carro, dirigindo-se para a igreja. Quase não tinha tempo de chegar ao altar, entra Laura, ele olhou para ela, achou-a deslumbrante no seu vestido verde água, ela não quis ir de branco. O vestido era de corte simples mas muito elegante. Sobre os cabelos trazia, um pequeno chapéu ornamentado com pequenos botões de rosa da cor do vestido, e de onde pendia o véu também do mesmo tom. Estava linda! Ele pensou consigo: Vens muito linda, mas se pensas que assim me apanhas, vais ver a surpresa que irás ter. Ao som da marcha nupcial, e, pelo braço do pai, Laura desliza mais do que anda, a caminho do altar. Ouviu-se o resmalhar dos vestidos das senhoras, a sentarem-se. Laura chega ao altar e a cerimónia começa…. Luís não ouve nada. Está com o pensamento fixo no que se propões fazer, até que surge a pergunta sacramental, Luís Miguel de Sousa, é de sua livre vontade casar com Laura Raquel Rodrigues? Silêncio….. O padre pergunta de novo: -, Luís Miguel de Sousa, é de sua livre vontade casar com Laura Raquel Rodrigues? Como que acordado subitamente de um sonho, Luís vê á sua frente os olhos de Laura, inquietos…numa fracção de segundo ela lembrou-se de toda a cena da noite em que ele supostamente a tinha pedido em casamento; das suas interrupções, a que ela não prestara atenção. Laura tremeu ao ouvir de novo: - Luís Miguel de Sousa, é de sua livre vontade casar com Laura Raquel Rodrigues? Olhou o noivo quase em pânico. Toda a igreja estava em absoluto e pesado silêncio. Subitamente ouve-se a voz de Luís dizer alto e claramente: Sim é! Ouviu-se um enorme e uníssono suspiro de alívio. O sr. Geraldo vermelho, afogueado, limpava com o lenço branco o suor que lhe corria em fio pelo rosto. D. Joana quase teve um fanico. Só D Ifigénia, e o sr. Rodrigues ficaram impávidos e serenos. Afinal, tinham passado por uma situação igualzinha, há quantos anos? Quase quarenta. Quarenta anos de uma enorme e calma felicidade; trocaram um beijo de amoroso carinho, murmurando: -Lembras-te? Parece que afinal todos os jovens têm medo de casar, como nós tivemos Após o lauto copo d’água os noivos sumiram-se em direcção á lua de mel…. E não é que na pressa Luís que tinha arrumado três malas só levou uma? E, foi exactamente a mais pequena. Afinal foi obrigado a voltar para sempre ao apartamento, donde saíra jurando nunca mais voltar…..
Maria Isabel Galveias (Lylybety)